Immanuel Wallerstein: guerra tornou-se insustentável e retirada quase certa diz algo sobre atual isolamento de Washington. Tradução: Daniela Frabasile
Os dois candidatos para a presidência dos Estados Unidos parecem
estar tentando falar um mais alto que o outro, no que diz respeito ao
Irã, Síria e Israel/Palestina. Cada um alega que está fazendo mais para
apoiar os mesmos objetivos. Não é estranho que não exista a mesma
competição verbal sobre o Afeganistão?
As coisas mudaram há pouco. Durante muito tempo, Democratas e Republicanos disputaram quem era mais macho do
Afeganistão? Lembre-se de que o conceito de uma “ofensiva”, capaz de
ganhar a guerra foi endossado pelo presidente Obama, em seu discurso na
Academia Militar, em dezembro de 2009. De repente, desde março de 2012,
parece que isso se tornou um assunto sobre o qual ninguém quer se
posicionar de forma aberta. Existem algumas explicações simples. Os
Estados Unidos têm pouco para mostrar, na guerra mais longa em que já se
envolveram. O inimigo, o Talibã, é uma força de enorme resilência,
principalmente nas áreas Pashtun, a maior zona étnica do país.
Os
Estados Unidos impuseram, de forma mais ou menos solitária, o
presidente Hamid Karzai – um pashtun, não aliado ao Talibã. Karzai não
foi, e não é, bem aceito pelos líderes de várias outras zonas étnicas no
norte e oeste do país, que tentaram retirá-lo do poder. Esses outros
grupos têm apoio de potências externas: Rússia, Irã e Índia, todos tão
dispostos quanto os Estados Unidos a evitar que o Talibã volte ao poder.
Mas os Estados Unidos não vão trabalhar com o Irã, têm dúvidas quanto a
trabalhar com a Rússia e não parecem estar dispostos a coordenarem-se
com a Índia.
Em fevereiro de 2012, alguns exemplares do Alcorão foram queimados
por soldados norte-americanos, o que levou a violentos protestos
públicos no Afeganistão. Então, 16 crianças, mulheres e homens afegãos
foram massacrados por um soldado americano. Os Estados Unidos
desculparam-se por ambos os atos, mas isso não acalmou a tempestade. Em
18 de março, o presidente Karzai denunciou os americanos no Afeganistão
como “demônios”, envolvidos em “atos satânicos”. Ele disse que o
Afeganistão estava rodeado por dois demônios – o Talibã e os americanos.
O New York Times citou
um diplomata europeu anônimo dizendo “nunca na história, uma
superpotência gastou tanto dinheiro, enviou tantas tropas para um país, e
teve tão pouca influência sobre o que o presidente desse país faz e
fala”.
Os Estados Unidos, tentando salvar sua posição, começaram a se
retirar. O secretário de Defesa, Leon Panetta, já tinha dito em
fevereiro que o país sairia de uma posição de combate não no fim de
2014, como era planejado, mas em meados de 2013. No começo de abril,
Washington foi além. Anunciou que estava entregando o controle de
operações especiais – por exemplo, uso de aviões não-tripulados (drones) e ataques noturnos – para as forças afegãs. As tropas americanas exerceriam agora apenas um papel de apoio”.
O ministro das relações exteriores do Afeganistão, Zalmai Rassoul,
não pareceu agradecido. Ele anunciou que, uma vez que as tropas dos EUA e
da OTAN saíssem do país, em 2014, Kabul não iria permitir que seu
território fosse base de lançamento para ataques de drones contra o Paquistão.
Os paquistaneses, então, desferiram outro golpe contra os Estados
Unidos. Em 12 de abril, o parlamento aprovou de forma “unânime” uma
lista de condições para melhorar as relações entre os dois países e
reabrir a rota de suprimentos da OTAN no Afeganistão. Eles incluíram um
fim aos ataques de drones no território do Paquistão e um pedido de
“desculpa incondicional” pela morte de 24 soldados paquistaneses no
ataque aéreo da OTAN em novembro de 2011. Os EUA resistem a essas
condições. Mas dado que agora é evidente a divergência entre os
objetivos políticos americanos e paquistaneses no Afeganistão, não fica
claro se Washington poderá prevalecer.
Então, em 14 de abril, Lawrence Korb, que foi assistente do
secretário da Defesa no governo Reagan, publicou um artigo intitulado
“Hora de deixar que Karzai nos bote para fora”. Korb argumentou que os
Estados Unidos são, desde 1945, “muito melhores em começar guerras do
que em acabá-las satisfatoriamente”. Ele chamou atenção para o que
considerava uma perda desnecessária de vidas, nos dois últimos dois das
guerras da Coreia e do Vietnam.
Segundo ele, a exceção é o Iraque, em que os Estados Unidos se
retiraram por que “o primeiro-ministro iraquiano, Nouri Al-Malik, não
nos deixou escolha”. Ele diz: “no Iraque, o governo dos EUA deu sorte”.
Sua conclusão: ”assim como Al-Maliki nos forçou a fazer a coisa certa,
deveríamos permitir que Karzai tome o controle de seu próprio país tão
cedo quanto ele quiser”. Korb é um analista republicano conservador, que
vê máxima vantagem no fato de os Estados Unidos serem forçados a sair
do Afeganistão assim que possível.
Korb não está sozinho. Uma pesquisa do Washington Post / ABC News,
publicada em 12 de abril, mostra que apenas 30% da população concorda
que a guerra tem valido a pena. Ainda mais impressionante: pela primeira
vez, uma maioria de republicanos opõe-se ao conflito. Duas coisas
influenciam a opinião pública estadunidense. Primeiro, os afegãos não
parecem solidários com os esforços ou perdas militares dos EUA. Muito
pelo contrário. Em segundo lugar, os custos da guerra no Afeganistão são
astronômicos nesse momento, quando os Estados Unidos, e principalmente
os republicanos conservadores, estão tentando reduzir gastos
drasticamente.
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