Depois de três dias de festa nos cinco Caracóis zapatistas
pelo 10º aniversário das Juntas de Bom Governo (JBG) já está tudo pronto
para a tão esperada Escuelita da Liberdade, que começou hoje
(12/8) simultaneamente em La Realidad, Oventic, Morelia, La Garrucha,
Roberto Barrios, assim como no Centro Indígena de Capacitação Integral
(Cideci) em San Cristóbal de Las Casas”.
Mais de 1700 alunos vieram do mundo todo para participar da
primeira turma desta escola autônoma zapatista, entre os dias 12 e 16
de agosto. Ninguém sabe exatamente como vai ser, mas sabem que vão
aprender a escutar o que os povos originários de Chiapas têm a dizer.
Vão conviver com eles e participar de seu cotidiano.
Desde cedo, na manhã do 10 de agosto começaram a chegar ao Cideci alguns dos convidados à Escuelita.
Todos deviam chegar a esse espaço para saber o lugar onde terão as
aulas durantes os próximos cinco dias. Alguns decidiram ir ao Caracol
correspondente a pé mesmo e cederam, aos que chegariam mais tarde,
espaço nos ônibus de traslado.
No dia 11, apareceram rios de gente com suas mochilas
pesadas, caminhando pela trilha de chão batido que chega ao Cideci para
confirmar sua inscrição. Deviam ter seu número de confirmação de
registro e uma identificação em mãos. Vários grupos de apoio ajudaram a
agilizar as inscrições e a organizar os alunos em filas segundo o
Caracol a que iriam viajar.
Antes das 11 da manhã, duas caminhonetes com o letreiro
“Maestr@s da Escolinha Zapatista” chegaram, com parte do comando do
Exército Zapatista de Liberação Naciona (EZLN) a bordo – Tacho, David,
Felipe, Zebedeo, Bulmaro, Ismael, Miriam, Susana, Hortensia e Yolando,
entre outros. Coordenaram a saída dos mais de 45 veículos entre
caminhonetes com caçambas, kombis – todas identificadas com o município
autônomo zapatista ao qual pertencem – e um School Bus amarelo estacionados na entrada do Cideci, ali onde começa o caminho velho a San Juan Chamula.
A maioria dos alunos chega sem uma expectativa concreta,
“para ver o que encontram o como será”; mas vêm, sim, dispostos a
escutar, aprender e trabalhar muito. Se respira emoção e impaciência
entre os que estão já estão para sair. Muitos deles nunca estiveram em
uma comunidade indígena ou em um Caracol zapatista, como Federico Gómez
do movimento “Más de 131” que começou a se aproximar do zapatismo faz
aproximadamente um ano. De seu coletivo, chegaram mais 20 pessoas à Escuelita.
Krisna é trabalhador sexual transgênero e vem da Cidade do
México. Comenta que lhe interessa conhecer as funções de homens e
mulheres na luta zapatista. “Venho aprender mais. Nada melhor que os
companheiros, que nos presentearem seu tempo para ensinar. Vai ser tudo
horizontal, com muito respeito e dignidade, e vamos esperar que eles nos
compartilhem seus processos de autonomia”.
Entre os alunos, além de mexicanos e mexicanas de quase
todos os estados, há gente de todas as partes do mundo, mas sobretudo da
Europa e Américas — do Sul, Central, do Norte. Gente que não está
articulada com nenhum coletivo, coletivos que acabam de nascer e estão
em pleno processo de formação, grupos e movimentos aderentes à “Sexta Declaração da Selva Lacandona”
e intelectuais que acompanham a luta zapatista desde seus inícios.
Entre esses rostos conhecidos, chegaram Jean Robert, Gustavo Esteva e
Pablo González Casanova que figuram, junto com outros, entre “os
convidados especiais que estarão isentos de qualificações” porque, como
expressou o Subcomandante Marcos em um de seus últimos comunicados. “Entendem bem o que é a liberdade segundo os zapatistas”, mas devem
estar presentes neste momento tão importante que caminha “até um só
destino, que também é delas e deles”.
Também chegaram às terras sagradas da alegre rebeldia
músicos que apoiam o zapatismo desde sempre como o Mastuerzo e Rocko
Pachukote. Participaram do espetáculo inaugural da Escuelita que começou às 9h da manhã e terminou às 9h da noite e foi transmitido ao vivo na internet pelo coletivo Koman Ilel.
“Onde podemos encontrar uma escolinha que dê gratuitamente
transporte, hospedagem, alimentação, livros de texto, materiais e onde,
ao mesmo tempo, haja um professor por cada aluno, 24h por dia contigo
durante o curso?”, comenta Rocko em entrevista com a Rede de Mídias Livres de Chiapas em
uma das cabanas de sapé do Cideci. Segundo ele, a essência da escola é
ensinar e aprender como ser seres humanos melhores. Vê tudo isso como
uma sábia iniciativa que vem de Votán Zapata
nesses momentos em que, em todo os mundos, os movimentos estudantis são
parte fundamental da transformação das sociedades. No Chile, México, em
toda a América Latina, os estudantes estão questionando o que é
educação e que educação estão dando a eles. “Nos educam para trabalhar
em suas transnacionais para seus projetos destruidores ou a educação
pode ser para sermos melhores seres humanos?”, pergunta-se o roqueiro e
ativista mexicano que, apesar de ser convidado a essa primeiro edição da
escolinha, assistirá à segunda edição.
Às três da tarde, depois de horas debaixo de um intenso
sol, começaram a desfilar as primeiras caminhonetes e kombis em direção a
La Realidad, município da Las Margaritas, um dos Caracóis mais
afastados de San Cristóbal de Las Casas. Na fila, encontramos Luiz
Antônio Guerra que veio de Goiás, Brasil, e participa do Movimento Passe
Livre: “venho aprender sobre liberdade e sabedoria dos companheiros
zapatistas”.
“Vão a La Realidad? Podem deixar aqui as mochilas.
Carreguem só o que vão beber no caminho”, comenta do comandante Davi com
um rádio nas mãos. “Mochilas aqui, alunos ali”, indica uma comandante
que organiza sem parar, junto com Tacho e Davi, para que a saída seja
fluida e organizada.
O resto dos alunos e alunas espera a partida paciente,
sentados no jardim do Cideci, enquanto tocam violão e cantam canções
alegres. Começa a convivência do que talvez, nos próximos dias, plante a
semente de uma possível rede de redes de movimentos, tão necessária no
contexto do México e do mundo atual — rasgado de dor e esquecimento, mas
cheio de esperança com novos movimentos estudantis, de meios
independentes, em defesa do território e de outras resistências rurais e
urbanas que entendem a construção de autonomia como um caminho para
construir um mundo onde cabem muitos mundos possíveis.
Enquanto isso, os fotógrafos da mídia comercial, aos quais
não foi permitido tirar fotos durante as festas do 10º aniversário nos
Caracóis, pulavam contentes, compensando seu desejo de captar imagens
dos companheiros e companheiras zapatistas encapuzados. Tentavam
identificar os e as comandantes debaixo de seus gorros pretos. Faziam
perguntas que nunca seriam respondidas e que só os desviavam da tarefa
que lhes foi encomendada: organizar a saída da Escuelita.
Recordamos com um grupo de cinco alunos, que esperam sua
vez para sair, as palavras do subcomandante Moisés, no comunicado do 17
de março de 2013, que anunciou os primeiros detalhes da Escuelita zapatista:
Você compareceria a uma “Escuelita” onde as
professsoras e professores são indígenas, cuja língua materna está
rotulada como “dialeto”?
Conteria a vontade de estudá-l@s como objeto de
antropologia, da psicologia, do direito, do esoterismo, da
historiagrafia, de fazer uma reportagem, de lhes fazer uma entrevista,
de dizer-lhes sua opinião, de dar-lhes conselhos e ordens?
Poderia vê-l@s, ou seja, escutá-l@s?
Ao menos esses dez alunos estão dispostos a escutar,
aprender e viver a experiência sem a necessidade de tirar fotos nem
fazer entrevistas. Perguntaremos a eles em cinco dias, quando
regressarem da primeira turma da Escuelita, que já tem várias
outras programadas, devido à alta procura. A próxima, entre 3 e 7 de
janeiro de 2014, logo depois da celebração dos vinte anos do
levantamento zapatista.
A las 9 de la noche salían los últimos grupos de
estudiantes rumbo a su Caracol con sus cuadernos de texto de primer
grado del curso “La libertad según los Zapatistas” y dos discos
compactos. Pero para esta primera edición, también habrá videoescuelita
con retransmisiones en directo a las 14h y a las 21h para quienes se
hayan registrado a través del e-mail video@ezln.org.mx. En varios
lugares del mundo colectivos que no pudieron llegar físicamente a México
ya están organizando su Escuelita virtual que empieza hoy a las 2 de la
tarde.
Às 9 da noite saíam os últimos grupos de estudantes rumo a
seu Caracol, com seus cadernos de texto de primeiro ano do curso “A
liberdade segundo os Zapatistas” e dois discos. Mas para essa primeira
edição, também haverá videoescola com transmissões ao vivo das 14h às
21h, para quem se registrou através do e-mail video@ezln.org.mx. Em vários lugares do mundo coletivos que não puderam chegar fisicamente ao México já estão organizando sua Escuelita virtual que começou ontem às 2h da tarde.
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