Antom Fente Parada. O autor é um dos gestores destes blogue e militante da esquerda independentista galega em Anova-Irmandade Nacionalista. Grande parte do
presente artigo foi elaborado a partir de duas achegas publicadas em
2011 no portal alternativo galego Altermundo.
Engadimos novos materiais para retomar algumas das reflexões lá
vertidas1.
1.- A fim da I Globalização
Tenhamos muito cuidado em Europa: ninguém nos vai
avisar quando chegue o fascismo nem sequer se vai apresentar –
seria absurdo- com esse nome. Tenhamos cuidado: não vamos reconhecer
o nazismo quando regresse porque falará de novo, como então, de paz
e civilização, de valores e normalidade, Santiago Alba Rico.
Senhores,
não estejam tão contentes com a derrota [do Hitler]. Porque embora
o mundo se tenha posto de pé e tenha detido o Bastardo, a Puta que o
pariu anda quente novamente, Bertolt Bercht (6/05/1945) referindo-se
ao capitalismo como causa do fascismo.
No livro XVIII
Brumário de Luís Bonaparte
o velho barbudo, Karl Marx, dizia – num claro influxo hegeliano –
que a história repete-se uma vez como tragédia e outra vez como
farsa, como se do “etorno retorno” de Nietzsche se tratasse. A
Globalização não é tampouco, nem muito menos, um fenómeno novo
dando-se a primeira durante a hegemonia no sistema-mundo capitalista
do Império británico. Foi a “era do capital” (para Hobsbawn
entre 1848-1870) e o tempo do laissez-faire
também
avalado entao pela crise de 1870, mas cuja ortodoxia se manteve até
o crack de 1929 e, em boa medida, conduziu a duas guerras mundiais.
Na segunda Globalização as crises análogas foram a Guerra do
Vietnam, que marcou a crise-sinal da hegemonia dos EUA e a crise de
2008, comparável em este sentido a de 1929 embora no plano económica
seja mais parecida à de finais do XIX2.
Após
as guerras napoleónicas também se produzira uma concentração sem
precedentes até então de recursos sistémicos, financeiros e
militares em mãos de apenas um Estado, o Império Británico. Este
empregou três mecanismos que teriam também presença destacada na
hegemonia norte-americana após 1945: repressão, reforma e
debilitamento do poder dos grupos subalternos mediante processos de
expansão económica a escala mundial; ou seja, “globalizando”
(globalização ou mundialização – na escola francesa - são em
rigor uma manifestação e eufemismos de Imperialismo) com o
laissez-faire
que beneficia aos que na situação de partida estão em melhores
condições para concorrer. No entanto, o peso da “reforma” é
infinitamente superior no caso da hegemonia norte-americada do que na
britânica. Se a imagem da Sociedade de Nações era o estado
policial do XIX o da ONU era o estado do bem-estar do XX – que não
se entenderia dito seja de passagem sem a existência duma
alternativa real ao capitalismo, for esta mais ou menos sucedida, a
URSS.
A
partir de 1917 irrompe a URSS, um desafio revolucionário que inçará
esperanças nas classes trabalhadoras por toda a parte. Este desafio,
somado à experiência da Grande Depressão de 1929 e do fascismo,
convenceu os grupos dominantes das principais potências imperiais da
necessidade de reformar o sistema-mundo capitalista da I
Globalização. Existia um consenso amplo de que a economia e a
política do laissez-faire
contribuíram para o ocaso social e político do período 1914-1945
e, portanto, as lições do New
Deal eram
aplicáveis por toda a parte.
O
presidente norte-americano Woodrow Wilson elaborou uma alternativa
reformista ao chamamento de Lenine à «revolução
mundial» e à «rebelião contra o Imperialismo», que consistiu em
catore pontos e no chamamento à autodeterminação dos povos
(brancos) e ao século do «homem corrente». No entanto, na altura o
Congresso rechaçou aquela medida, mas também Lenine fracassara após
a derrota da revolução na Alemanha e o ascenso do fascismo em
Itália. Já que logo, na década de 20 os triunfadores eram
novamente os que propunham o restauracionismo dum caos sistémico
(como o que vivemos desde 2008). Porém o contexto era diferente do
período 1840-1860 e a classe operária (embora as derrotas sofridas)
contava com maior poder para confrontar o laissez-faire
já que os governos tinham que preocupar-se pelos níveis salariais e
as condições de vida dos cidadãos que participavam das eleições.
A
comissão internacional de Genebra sobre o ouro forçou políticas de
“ajuste estrutural” (como os ultraliberais após o colapso de
Bretton-Woods) em determinados estados para conseguir supostamente
moedas saudáveis (convertíveis). Estas políticas de shock3
geraram graves transtornos sociais e os governos tinham que decidir
entre a “confiança dos mercados [financeiros]” e o resultado das
eleições democráticas. Assim a fuga de capitais teve um papel
importantíssimo, tanto no derrocamento dos governos liberais na
França quanto no desenvolvimento do movimento nazi na Alemanha.
Enquanto isso acontecia os partidos social-democratas eram afastados
do poder: em Aústria em 1923, na Bélgica e França em 1926, na
Alemanha e em Grande Bretanha em 1931... ao tempo que se reduziam os
serviços sociais e se esgaçavam as resistências dos sindicatos
para “salvar” (hoje diriam “resgatar”) a moeda.
A
restauração do padrão–ouro converteu-se num símbolo da
solidariedade mundial na década de 1920 na retórica do
establishment
até que o craque de 1929 devolveu o mundo à realidade: os mercados
“livres” não se recuperaram embora se sacrificaram os governos
“livres”. Aí emergiu o fascismo na década de trinta após
governos eleitos nas urnas impor políticas autoritárias com o apoio
do “liberalismo económico”. No cenário atual, segundo o já
referido artigo de Wallerstein:
Por fim, podemos estar certos de
duas consequências reais, na próxima década. A primeira é o fim
do dólar como moeda de último recurso. Quando isso acontecer, os
EUA terão perdido uma grande proteção para seu orçamento e para o
custo de suas operações econômicas. A segunda é o declínio –
provavelmente sério – no padrão de vida relativo dos cidadãos e
residentes nos EUA. As consequências políticas deste último
movimento são difíceis de prever em detalhe, mas não serão
irrelevantes.
Todavia,
o New
Deal,
os planos quinquenais soviéticos, o fascismo e o nazismo foram
respostas à necessidade de liscar dum mercado mundial em
desintegração e refugiar-se na economia “nacional”. Todos estes
projetos opunham-se ao laissez-faire
em desintegração e respondiam ao desafio do desemprego maciço. O
desemprego reduziu-se com uma rápida expansão industrial que, no
entanto, exacerbou outras contradições e antagonismos na procura de
novas fontes de matérias primas. Uma das mais importantes os
vencelhos entre recursos militares e industriais, que são
claríssimos nos EUA desde a Guerra
das Galáxias de
Reagan e em China também desde a via
socialista de mercado.
Em
definitiva, a obstinação pelos dogmas da teologia da ortodoxia do
livre mercado (uma das mais terríveis utopias reacionárias)
conduziu para duas grandes guerras, que exterminaram milhões de
pessoas e jogaram à miséria a outras tantas, para o fascismo, como
solução burguesa perante a ameaça duma revolução para implantar
uma ditadura de classes esmagadora4
e, por último, para continuar com a destruição criativa do
capitalismo, tal e como Schumpeter lhe chamava, alheia então aos
limites do planeta que se apresentam sem ambagens na atualidade e
complicam a emergência dum novo desarrollismo
no
Sul e do keynesianismo nos estados do centro do sistema-mundo
capitalista. Era a hegemonia norte-americana que emergia do caos de
1914-1945, homólogo do nosso 1973 que ainda não sabemos quando (mas
sim semelha que infelizmente como) pode acabar.
2.-
A I Globalização: a esquerda
Em
1928, o VI Congresso do Comitern
sancionava uma «viragem para a esquerda», punha fim à política de
«frente operária unida» (tão solicitada pelo POUM e Andreu Nin no
Estado espanhol anos depois, o «frente único») e a
social-democracia devia ser descrita pelos comunistas a partir deste
momento como «social-fascismo».
Estaline,
na aspiração de construir o «socialismo num só país» precisava
desesperadamente laços comerciais com os estados capitalistas
avançados para trocar cereais soviéticos e outras matérias e
recursos que lhe permitiram a aquisição de tecnologia e
conhecimentos para a industrialização. O Comissário do Povo para
Assuntos Externos e ex-menchevique, Georgi Chicherin, cuidava com
acerto que era um disparate perigoso denunciar a outros socialistas
como «socialfascistas» e tratou de comunicar a sua opinião à
liderança soviética. Porém a ideia que corria na altura de que
Estaline confiava a política externa a terceiros enquanto se
centrava nas manobras internas do partido e na transformação
económica da URSS era falsa, por muito que ele não dirigira o
Comitern
nem
o Comissariado do Povo para os Assuntos Externos que pareciam modelar
a política externa. A realidade é que ninguém se atrevia a tomar
qualquer iniciativa sem consultar a Estaline (incluindo aqui os
integrantes do Politburo).
No
entanto, isto não contradiz as intervenções de Chicherin, já que
a função deles era o conhecimento factual e técnico. Ora, toda vez
que o Politburo
definia uma linha devia implementar-se sem crítica nenhuma como
técnicos, que não políticos na verdade, da diplomacia soviética.
A liderança soviética centrava-se nos planos quinquenais e em
esganiçar um isolamento que apercebiam perigoso para a sobrevivência
face os estados capitalistas.
Bukharine
(que já em julho de 1929 escreveu a Estaline «não pretendo lutar,
nem lutarei») foi apartado do Comité Executivo do Comitern
em abril de 1928, no tempo em que Jules Humbert-Droz afirmava que os
discursos de Estaline era um campo de mentiras, que Angelo Tasca
dizia dele que era o «porta-estandarte da contra-revolução», que
György Lukácks e António Gramsci protestavam pelo desprezo do PC
perante as reformas democráticas na Europa. Porém, para muitos
pouco ou nada se passou por isso já que a quinta-feira 29 de outubro
desse ano estourava, após semanas caóticas nos mercados de ações,
o pânico entre corredores e banqueiros e, ao tempo que as ações se
mal vendiam a um ritmo louco, a bolsa de Nova Iorque (a da principal
potência emergente na altura da hegemonia financiarizada británica)
entrava em falência.
Já
que logo, entende-se bem que é aqui onde se engarça a radicalização
da estratégia comunista da Comitern
que parecia acertada na altura: quanto pior melhor. Por outras
palavras, o desemprego, a inflação (que golpeava Alemanha como
nenhum outro estado capitalista) e uns ordenados, que não cobriam as
despesas correntes eram o cenário sonhado por Estaline e os
comunistas da ortodoxia moscovita. Hitler e os nazis eram tratados
como simples sintoma da prodredume do capitalismo.
No
entanto, na esquerda existam vozes que advertiam para o perigo do
nazismo. Trotski indicava que Mussolini era mau e que Hitler seria
ainda pior. Advertia, ao igual que Bukharine dos perigos da política
de extrema-direita e do fascismo em Europa e sabia que as suas
primeiras açoes seriam suprimir os partidos comunistas dos seus
respetivos estados. As organizações fascistas e de extrema-direita
subiam como a espuma por toda a Europa central e oriental quanto
recrudescia a crise económica e social. Hitler e o NSDAP
beneficiar-se-iam enormemente da depressão económica alemã,
enquanto Estaline dava instruções ao Comitern
para que os PC atacaram os outros partidos de esquerda, já que
social-democratas, trabalhistas e outros partidos de esquerda era
promotores do social-fascismo
e, portanto, havia que abandonar a política de frente operária
unida para adentrar-se num esquerdismo próprio do retratado por
Lenine em A
doença infantil do comunismo.
Em
Alemanha os comunistas foram à greve geral sem sucesso já que os
trabalhadores temiam perder o emprego devido à crise e o alto
desemprego. O Partido Comunista polemizava com os seus irmãos. Tanto
eles como o SPD eram praticamente hegemónicos entre a classe
trabalhadora, mas a rutura da frente operária unida conduziu para o
mais grande dos fracassos. Enquanto em 1932 os nazis conquistavam o
maior número de votos e arrancavam de Hidenburgo a chancelaria, o 30
de janeiro de 1933, os comunistas e os socialdemocratas brigavam
pelas ruas de Berlim. Ao tempo, a URSS mantinha relações com a
Itália fascista a pesar de que Mussolini perseguira o PCI. Hitler,
porém, suprimiu o Tratado
de Rapallo
e restringiu as relações económicas o que obrigou a Estaline a
procurar um novo sócio preferente no caminho para a
industrialização: os EUA. A Ford
Motors,
por exemplo, cedeu encantada equipamento e especialistas para a
enorme fábrica de carros de Nizhni Novgorod, ao tempo que Roosevelt
aplanava o caminho para o reconhecimento diplomático da URSS.
A
realidade foi que o Comitern
não reagiu até que o fascismo triunfou claramente com as suas
piores roupagens. Agás China e a URSS, Checoslováquia e França
contavam com os maiores PC do mundo e foi lá onde as bases esganaram
a linha do Comitern
para evitar a sorte dos seus homólogos italianos e alemães. Em
fevereiro de 1934 os militantes socialdemocratas e comunistas
organizaram juntos em Paris uma greve geral obviando todo o que
Maurice Thorez (na altura líder do PCF) dizia. A URSS entrava na
Liga de Nações, até há pouco descrita como uma organização das
potências capitalistas ganhadoras da Grande Guerra para manterem o
seu domínio global, para limitar a expansão do Japão e da
Alemanha.
Assim
as coisas, o Comitern
teve de recuar. Agora, liberais, socialdemcoratas e comunistas
uniam-se no anti-fascismo e nas frentes populares, como que triunfou
em fevereiro de 1936 na II República espanhola, embora lá o PCE
tinha uma implantação social na altura testemunhal. O PCF fora
também pioneiro ao juntar-se a socialistas e liberais em julho de
1935 dando a presidência a León Blum, embora sem entrarem em
carteiras ministeriais em maio de 1936, e com Thorez falando de que
«temos de saber como terminar uma greve» perante o auge da
conflituosidade social. A esquerda voltava a tender pontes de
fraternidade sobre um inimigo comum que abalava Europa, mas a
Alemanha e Itália já estavam perdidas, milheiros de camaradas
assassinados e a predição de Lenine duma sequência de guerras
mundiais tornava-se a cada passo mais certa e, de facto, a fim da
Guerra Civil espanhola em 1936 precederia em poucos meses ao começo
da II Grande Guerra.
A lição para o presente
semelha clara. Com uma correlação de forças ainda mais
desfavorável para o mundo trabalho do que na altura, sem uma
alternativa realmente existente ao capitalismo e com a esquerda em
reconstrução por toda a parte no Velho Continente aguardemos que,
novamente, não seja tarde demais para pular em todo o Estado
espanhol e em Eurolândia por um frente amplo a prol da rutura
democrática, a (re)conquista da soberania popular e o respeito pelos
diferentes feitos nacionais. A história assinala que a credibilidade
da esquerda perante amplas capas sociais passa, sem dúvida, por este
caminho...
3.-
Algumas lições para o presente
Boaventura
de Sousa Santos centra boa parte dum recente artigo seu5
na necessidade de falar não apenas de direitos da cidadania, mas
também dos deveres desta:
Uma das razões para
tendermos a falar mais de direitos do que de deveres reside em que
nas democracias se assume que o dever de garantir a vigência dos
direitos pertence ao Estado e que cabe aos cidadãos apenas fruir e
defender os seus direitos. E o que ocorre quando o Estado deixa de
cumprir esse dever como acontece agora? Cabe aos cidadãos o dever
coletivo de defender os direitos por todos os meios pacíficos ao seu
alcance.
Longe
de ser um dever abstrato, é um dever concreto e situacional. O seu
exercício acarreta riscos porque, quando o Estado se demite do seu
dever, as instituições são vítimas de uma patologia insidiosa:
estão vigentes mas dedicam-se a realizar a missão contrária àquela
para que foram criadas. É assim que o Estado social se converte em
Estado antissocial e a segurança social em insegurança social. Por
esta razão, o dever dos cidadãos tem muitas vezes de ser exercido
fora das instituições e, quando exercido dentro delas, assim um
caráter contracorrente que exigem coragem e determinação.
Como
de costume é de por sim ilustrativo o que Sousa Santos nos diz. Cabe
destacar que a crise de 2008 reforçou e não debilitou como se podia
pensar as teses ultraliberais, especialmente no centro do
sistema-mundo. Isso em boa parte apenas é possível porque no
caminho a um mundo multipolar grandes destacamentos de consumidores
chineses, índios ou brasileiros estimularam a demanda. Em 2009 para
Alemanha o principal mercado já era o chinês em exportações e não
os EUA. Contudo, a decadência hegemónica da potência mundial, hoje
os EUA ontem as Províncias Unidas ou a Grande Bretanha, coincide com
o período de financiarização e da maior obtenção de lucros por
esta via. Assim, se em 1985 os EUA controlavam 16% dos lucros
empresariais em 2008 atingia já 41% e o 0'1% mais rico desse país
aumentou a sua riqueza um 700% entre 1980 e 2007.
Na
correlação de forças atual o capital obtém novas rendas reduzindo
o custe de trabalho e gerando um desemprego maciço cada vez mais
generalizado. As dez maiores companhias de Internet apenas criaram
200.000 postos de trabalho quando a sua capitalização bursátil
ascende a centos de milheiros de milhões6.
Esta realidade leva a pensar num sistema mais piramidal e
hierárquico do que nunca, com dinheiro que move a mídia, as
máquinas eleitorais... então é uma necessidade apostar pela Frente
Ampla, isso sim, tendo claro que bloco social e que aliança para quê
projeto.
No
entanto, é claro que a esquerda ainda não está pronta em boa
medida para assumir esta necessidade histórica e a sua situação de
debilidade é muitíssimo superior a da década de 30 no passado
século. A temporalidade da macroeconomia fará que os terríveis
efeitos da austeridade europeia se sintam com mais força a partir de
20157.
Na
atualidade, os produtos financeiros de derivados especulativos
representam já 720.000.000.000.000 dólares, enquanto o PIB mundial
apenas chega a 62.000.000.000.000 dólares ou a capitalização
bursátil mundial atinge “apenas” 58.000.000.000.000 dólares. A
esfera financeira nascida da desregularização escapa por completo
do controlo dos estados, ainda mais hoje do que antes da crise do
sistema-mundo capitalista iniciada em 2008. As atividades criminosas,
hoje mais globalizadas também do que nunca, ascendem a
1.500.000.000.000 dólares (o equivalente ao PIB de Rússia para
2010) e onde, evidentemente, não computa a deliquência de colo
branco. Como Pierre Conesa advirte8:
las
mafias (como término genérico) tienen comportamientos empresariales
análogos a los de los actores económicos, salvo en lo que a la
violencia se refiere. Definen su estrategia comercial en función de
los beneficios, de los riesgos, de su política de diversificación
de productos (multiplicidad de delitos) y de las posibilidades de
blanqueo y de inversiones. Adaptan su organización internacional (a
menudo muy jerarquizada) aprovechándose de la desregularización
financiera.
A
luz destes dados semelha, já que logo, difícil neste cenário
reprovar a tese de que o grande capital internacional foi o
responsável e o grande beneficiário da crise de 2008 e que a
continuidade das mesmas políticas económicas apenas pode conduzir
para um cenário ainda muito mais devastador. A desregulação
impulsada pelo FMI, o Banco Mundial e em Eurolândia a troika
contribui
para que cada vez um maior volume de lucro escape a qualquer controlo
e que aumente o interesse de apostar por atividades criminosas. Os
estados vem reduzidas as suas competências de dia para dia quando
não diretamente estados falidos atuam como guarda-chuvas de
organizações criminosas como em vários estados falidos das
Áfricas:
La
interpenetración entre delincuencia y mundo político permite que
ésta acceda a los mercados públicos y, simultáneamente, obtenga
protección a escala nacional (desmantelamiento de células
judiciales consideradas demasiado eficaces, como en Italia) e
internacional (adopción de normas poco coercitivas). Los Estados,
incluso los democráticos, nunca se han prohibido a sí mismos la
realización de actividades ilícitas. La financiación de la
guerrilla afgana antisoviética por la Central Intelligence Agency
(CIA) a través del tráfico de drogas, para gran perjuicio de la
Drug Enforcement Authority (DEA), tenía la ventaja de no necesitar
el aval del Congreso.
Porém
a perda da soberania dos estados não é um fenómeno exclusivo dos
“tradicionais” estados falidos. O 16 de novembro de 2002
naufragava nas nossas costas o Prestige.
O
resultado do juízo-farsa que vimos de conhecer revela que, como no
caso do Álvia acidentado em Angrois, apenas os “maquinistas” -
os trabalhadores dalgum modo- são culpáveis dos desastres. Também
na crise de 2008 por “viver por cima das suas possibilidades” e
não a banca por especular por cima das suas possibilidades ou mesmo
das possibilidades físicas do Planeta. A demanda de indemnização
do petroleiro (em última instância capital de Marc Rich conhecido
narco-traficante de armas e heroína) encontrou-se com sessenta
sociedades pantalha implantadas em seis estados... como é então
possível nem sequer sonhar com que o grande capital (disciplinado,
hierárquico, com uma forte solidariedade de classe...) respondesse
aos, ao fim e ao cabo dada a magnitude da catástrofe ridículos,
seis mil milhões de euros exigidos?
Câmaras
municipais como a de Compostela com mais duma dúzia de imputados,
tramas como a Gürtel,
Pokemon, Nos... ou
fenómeno da porta giratória9
demonstram também até onde no Estado espanhol o desfalco de fundos
públicos responde, em última instância, ao entramado criminoso
internacional. Apenas aí se podem enquadrar as políticas aplicadas
polo chefe do Protetorado
de Espanha, Mariano
Rajoy. Ao igual que a Yakuza
japonesa
se negou, após inserir-se na esfera política nipona, a assumir as
perdas imobiliárias na crise de 2008 (que sim pagou o Tesouro
público). Os investimentos no AVE (o comboio de alta velocidade
espanhol) é gasto público para resgatar as grandes empresas do
setor imobiliário também ajudas com a criação dum banco malo
(ativos tóxicos dos que responde a cidadania com impostos e dos que
impunemente se desfiz a banca). Nova
Caixa Galicia ou
Bankia,
as privatizações na educação ou na sanidade são alguns exemplos
mais duma listagem sem fim no tocante ao espólio do público.
Na
crítica ao euro e a recuperação da soberania nacional, ou a
conquista da mesma nas nações sem Estado próprio como a Galiza,
fica clara a necessidade da desmundialização, termo cuja
paternidade atribuiu-se ao economista filipino Walden Bello – se
bem fora empregado anteriormente por Bernard Cassen em 1996. Para
Lordon se foi possível estabelecer com bastante «facilidad
un acuerdo para llamar “mundialización” a la configuración
presente del capitalismo, debería ser posible otro acuerdo para
entender que “desmundialización” expresa la afirmación de un
proyecto de ruptura con ese orden».
E
aqui é preciso entendermos por igual a importância do feito
nacional, face o universalismo abstrato, a começar por «los
asalariados chinos u los asalariados franceses se encuentran en la
misma relación de antagonismo de clase, cada uno respecto de “su”
capital, pero no es menos cierto que las estructuras de la
mundialización económica los ubican también y objetivamente en una
relación de antagonismo mútuo».
Entender isto é evitar o que Marx criticava dos jovens hegelianos de
esquerda: melhor que contar com “essências” que produzam por sim
próprias improváveis efeitos, seria fantasiar com refazer as
estruturas reais, que determinam sem dúvidas as relações em que
entram os diversos grupos sociais.
Notas a rodapé
1Fente
Parada, Antom (2011): “O fim da I Globalizaçom” em Altermundo:
http://www.altermundo.org/o-fim-da-i-globalizacom/
Fente
Parada, Antom (2001), “O I fim da I Globalização: a esquerda”
em Altermundo:
http://www.altermundo.org/o-fim-da-i-globalizacao-ii-a-esquerda/
2Wallerstein,
Immanuel (2013), “As consequências do declínio americano” em À
Revolta entre a mocidade:
http://revoltairmandinha.blogspot.com.es/2013/11/as-consequencias-do-declinio-americano.html
3Para
um desenvolvimento pormenorizado da doutrina do choque no terreno
político (social e económico) a partir da psicologia e os
experimentos desenvolvidos na década de 50 que logo empregaria a
CIA nas torturas da Contra em
Nicaragua veja-se o livro A
doutrina do choque (The
shock doutrine)
da economista canadiana Naomi Klein.
4Realmente,
como demonstra também o caso da II República espanhola à
perfeição, o fascismo conseguia “disciplinar” a mão de obra,
reduzir drasticamente o valor do trabalho e permitir assim que o
capital aumentasse as suas rendas e superá-se a famosa lei
enunciada por Marx sobre a queda na taxa do ganho que provoca as
crises.
5Boaventura
de Sousa Santos (2013), “Os deveres dos cidadãos” em Visão,
nº 1072, 19-25 de setembro de 2013, página 32.
6Há
18 meses o Facebook
começou a vender as suas ações e ingressou no mercado bolsista em
maio de 2012. As suas ações foram transacionadas a 28'5 euros,
colocando o valor de mercado da empresa em 67 mil milhões de euros.
Hoje as ações – quando Twitter
também vá unir-se à bolsa – estão cotadas a 32 euros e a
empresa vale por volta de 77'5 milhões de euros. No caso de Google
entrou em bolsa em agosto de 2004 com as ações a 64 euros e a
empresa a valer 17 mil milhões de euros. Atualmente, cada ação
vale 665 euros e o valor de mercado da empresa atinge 222 milhões
de euros.
7Fréderic
Lordon (2011), “¿Temor a la desmundialización?” em EL Atlas
Conflictos de Fronteras, Le
Monde Diplomatique en Español, 2013, páginas 93-98.
8Conesa,
Pierre (2012). “La globalización criminal” em El
Atlas de Le Monde Diplomatique: Nuevas potencias emergentes,
pp. 62-67.
9Fente
Parada, Antom (2012), “A porta giratória no Estado espanhol” em
À revolta entre a mocidade:
http://revoltairmandinha.blogspot.com.es/2012/05/porta-giratoria-no-estado-espanhol.html
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