Antom Fente Parada. Editor do blogue À revolta entre a mocidade e militante de Anova-Irmandade Nacionalista.
Eu traballo,
ti traballas,
el traballa,
nós traballamos,
vós traballades.
Eles comen.1
A Coordenadora Nacional de Anova-Irmandade Nacionalista acordou, no
passado dia 14 de setembro, contribuir para a criação duma Frente
Ampla não excluínte para as eleições europeias como ensaio da
quebra democrática com a II Restauração bourbónica. O acordado
afunda no acordo da nossa I Assembleia Nacional celebrada em junho de
contribuir a acelerar a queda com este regime apodrecido mediante a
soma de forças que multiplique.
Em maio de 2014 a esquerda não resignada tem que
demonstrar que o é mediante uma escolha bem simples: pode antepor o
eleitoral e o partidismo à necessidade de iludir à cidadania com
uma proposta que trairia consigo uma baixa abstenção e que, aliás,
barra nas urnas os partidos dinásticos deixando-os em minoria como
em abril de 1931 dando pé a um novo ciclo político; ou pode apostar
por uma Fronte Ampla POLÍTICA e não
apenas partidária. Sem unidade será
impossível começar, em qualquer naçao das que compõem o Estado
espanhol, programas realmente transformadores que vençam o férreo
poder da bancocracia e as elites políticas e económicas de
Eurolândia.
Política e integral, de toda a cidadania, que conte com os partidos
políticos, mas também com os movimentos cívicos. Com as forças
políticas galegas nacionalistas e de esquerda ruturista, mas também
com as forças políticas e as plataformas cívicas doutras nações
do Estado. Uma Frente Ampla que artelhar-se-há, já que logo, em
base à unidade popular, sobre um programa amplo e de comum
denominador que permita somar o máximo espectro de organizações
populares.
E nesse programa, na leitura de Anova, o
fundamental é:
a.- a quebra
democrática com a II Restauração
bourbónica, cujo correlato é mudar o modelo político, económico e
social imposto por 40 anos de fascismo e quase outros 40 de
franquismo sem Franco com umas elites herdeiras da ditadura que
pilotaram uma “Transição” de costas à maioria social.
b.- A demanda duma democracia
real, em sintonia com amplos setores da
sociedade civil, que, antes de mais, para ser merecente do seu nome
deve assentar-se em
três frentes complementares: no político a reconquista da soberania
popular;
no económico o combate contra a ortodoxia ultraliberal da troika;
no social, o respeito pelos direitos da cidadania onde se inclui o
direito
a decidir
de todas as nações do Estado espanhol e o respeito ao feito
diferencial de galegos, bascos e catalães (mas também doutros
territórios com línguas de seu e/ou feitos diferenciais como
Asturies, Aragão,
Andaluzia...).
Em
definitiva, uma Frente Ampla que faça ver a incompatibilidade
manifesta entre o respeito e a garantia dos nossos direitos com a
hegemonia do livre mercado, ou entre a democracia e o capitalismo
ultraliberal. Uma Frente Ampla que permita um amplo processo de
ruturas
com a arquitetura
institucional da democracia burguesa e com o capitalismo.
Uma
Frente Ampla que aguardamos chegue a Galiza e ao Estado espanhol 40
anos após o golpe de Estado que pus fim ao ensaio de socialismo
democrático
impulsado por Salvador Allende em Chile. Um ensaio, a primeira vista
truncado e fracassado, mas cujo eco se sente com força hoje na
emancipação de América do Sul: em Uruguai, em Equador, em Bolívia,
em Venezuela...
A
aposta de Anova exige tecer uma nova conceção estratégica de como
construir um novo Estado para um novo tipo de sociedade e, em
sintonia também com o que expunha Allende, tal conceção deve ter
presentes (ao menos) três cousas: a particularidade nacional de cada
processo (neste momento especialmente importante em Catalunya,
Euzkadi e a Galiza), uma política de alianças que permita a
independência dos explorados e oprimidos e, por fim, o caráter
democrático do processo revolucionário sendo este último ponto
indispensável e fundamental para avançar coletivamente alimentando
e legitimando o processo desde o conjunto da classe trabalhadora e os
sectores atacados pela ofensiva ultraliberal.
Salvador
Allende foi um militante socialista que advogou por uma ampla
convergência popular que fizera frente ao Imperialismo (hoje
denominado como globalização ou mundialização -na escola
francesa-) e à oligarquia que acumulou e acumula capital com a suor
da classe trabalhadora. Allende procurou sempre chegar ao Governo por
meio do sufrágio universal, opondo-se ao seu próprio partido que em
Chillán (1967) quis deixar de lado a via institucional e apostar
pela conquista armada do poder. O dia do seu triunfo eleitoral
assinalou:
Hemos
triunfado para derrotar definitivamente la explotación imperialista,
para terminar con los monopolios, para hacer una seria y profunda
reforma agraria, para controlar el comercio de importación y
exportación, para nacionalizar, en fin, el crédito, pilares todos
que harán factible el progreso de Chile, creando el capital social
que impulsará nuestro desarrollo.2
Assim,
os mil dias da Unidad
Popular
foram para o povo chileno um inédito processo que significou um
grande sacrifício para atingir um histórico empoderamento das
classes populares que apenas assim podiam confrontar – desde a
unidade mais ampla possível – o capital foráneo e os interesses
imperialistas. Uma via através da unidade
popular,
do socialismo
democrático,
que voltam percorrer
hoje os povos de América do Sul, embora seja hodierno uma correlação
de forças e um contexto evidentemente diferentes.
No entanto, tanto hoje como ontem, o caminho que propunha Allende
não é doado. Ao igual que na proposta de Anova exige fazer uma
leitura do presente como história, um olhar a longo prazo por cima
do cálculo eleitoral e uma audácia e uma teimosia sustentada no
tempo que poucos partidos e organizações têm na voragem do
curto-prazismo predominante na política. No entanto, toda a esquerda
deve antepor por cima de qualquer consideração o seu alvo
estratégico fundamental: a superação do capitalismo e a
emancipação social e nacional de todos os povos do mundo:
Como
decía Allende, la lucha del pueblo de Chile no es una lucha de
generaciones, menos el monopolio de un sólo partido, la lucha debe
ser de los trabajadores, de los estudiantes, de los profesionales y
de las múltiples organizaciones sociales y políticas dispuestas a
asumir el desafío de la unidad a pesar de las diferencias porque han
comprendido la labor histórica en la que vivimos.3
Esta
Frente Ampla, no entanto, não deve ver-se tampouco
como um ponto de chegada. É tão só o ponto de partida dum processo
que medirá a capacidade da esquerda não resignada para acumular
forças e demonstrar na praxe quê é o que é o socialismo para o
século XXI. O socialismo democrático, com uma visão de fundo,
compreende que toda verdadeira rutura com a ordem estabelecida é um
processo e não um acontecimento único que se dá um 15 de maio ou
um 14 de abril. E, finalmente, quê é o que xebra o socialismo
democrático de Allende do social-liberalismo ou ainda da
socialdemocracia? Que no horizonte que guia o quê fazer atual
mantêm-se todos e cada um dos alvos revolucionários inerentes a
todo socialismo revolucionário.
Notas:
1Xosé
Lois García, “Dun poema francés” em Borralleira pra
sementar unha verba [Monforte
de Lemos: Xistral], 1974.
2Discurso
de Salvador Allende na madrugada do 5 de setembro de 1970.
3Camila
Vallejo, “Los estudiantes desenpolvan un icono” em Le Monde
Diplomatique en español, nº
215, setembro 2013, pp. 16-18.
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