05/09/2011

Líbia: França e Itália lideram disputa pela ''reconstrução''

Eduardo Febbro. Artigo tirado de Carta Maior (aqui).

Começou a batalha pelos apetitosos contratos que a reconstrução da Líbia promete. Roma e Paris saem na frente da competição pelos negócios da reconstrução do país.

Assim como Itália, Inglaterra e Estados Unidos, a França apressa-se em realizar uma série de suculentos negócios com os rebeldes que tiraram Muammar Kadhafi do poder com a ajuda das mesmas potências que antes estendiam o tapete vermelho ante os pés do líder líbio.

Roma e Paris saem na frente da competição pelos negócios da reconstrução do país. No mesmo dia em que se iniciava na capital francesa uma conferência internacional com 60 países e organizações internacionais para discutir sobre a ajuda de emergência e a reconstrução da Líbia, a imprensa francesa revelava detalhes sobre os bastidores da ajuda militar fornecida por Paris à insurgência líbia. Segundo o matutino Libération, o Conselho Nacional de Transição (CNT), órgão que agrupa a insurgência, prometeu a França 35% do petróleo líbio em troca do apoio de Paris à campanha contra Kadhafi.

A França ocupa uma posição de vanguarda na intervenção da NATO. Paris elaborou, juntamente com Londres, a resolução 1973 da ONU que abriu o espaço aéreo para os aviões da Aliança Atlântica e depois usou a sua influência para aprová-la no Conselho de Segurança. A França foi também o primeiro país a reconhecer o Conselho Nacional de Transição como o “representante legítimo” do povo líbio. A hora da recompensa parece ter chegado para as companhias petroleiras francesas. O Libération publicou uma carta enviada pelo CNT, onde a organização política dos rebeldes evoca claramente “a assinatura de um acordo atribuindo 35% do petróleo bruto aos franceses em troca do apoio total e permanente a nosso Conselho”. O ministro francês de Relações Exteriores, Alain Juppé, disse que não sabia da existência da carta mas lembrou que, desde o início, o CNT havia dito “muito oficialmente” que, quando chegasse a fase da reconstrução, se dirigiria “preferencialmente aos países que o apoiaram”. Segundo Alain Juppé, isso é “bastante lógico e justo”.

França e Itália competem hoje pelos futuros contratos com as novas autoridades de Tripoli. Antes da queda de Kadhafi, a Líbia produzia 1,55 milhões de barris de petróleo por dia. Isso equivale a 2% da produção mundial e fez o país figurar na 17ª posição do ranking dos países produtores de petróleo. Durante o reinado do coronel Kadhafi, Roma importava 306.000 barris de petróleo por dia contra 205.000 da França.

No entanto, ao contrário de Paris, até a queda do coronel, Roma foi o primeiro sócio comercial da líbia com mais de 180 empresas italianas instaladas no país. A produção petroleira líbia caiu actualmente para 50.000 barris de petróleo por dia e serão necessários vários anos para que o sistema recupere altos níveis de produtividade. No entanto, o ouro negro não é a única meta das grandes potências. Estradas e infraestrutura também aparecem no cardápio. Alguns países, como a Itália, já estão presentes de maneira sólida. O Tratado da Amizade, firmado em 2008 entre Kadhafi e o presidente do Conselho Italiano, Silvio Berlusconi, permitiu a grupos italianos obter contratos consideráveis. Na lista, figura Finmeccanica (ferrovias e estradas) e a empresa de trabalhos públicos Impregilo (BTP).

A corrida entre Roma e Paris está aberta. O primeiro é um antagonista e sócio histórico, Itália, e o segundo um recém-chegado como Nicolas Sarkozy que soube tirar proveito da situação e localizar-se na linha de frente. Paris ocupou o lugar mais destacado da cena militar durante as operações da NATO na Líbia, enquanto Roma permaneceu entre as sombras.

As potências ocidentais desempenharão um papel central na reconstrução da Líbia. A sua influência será tão fundamental como foi nos anos Kadhafi. O Ocidente nunca se privou de pactuar com o astuto coronel, nem sequer nos campos que tinham a ver com a liberdade ou os direitos humanos. Esta semana, soube-se que a empresa francesa Amesys instalou na Líbia de Kadafi o sistema Eagle. Esse dispositivo permitiu que o regime espionasse todos os correios electrónicos e as conexões de internet da população. As potências ocidentais movem-se com duas chaves nas mãos: a dos valores da liberdade e da justiça e a chave dos negócios obscuros com as piores tiranias da história.

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