04/01/2012

Miséria, teu nome é “austeridade”

Tirado de aqui.

Declínio social e cultural da Itália: 25% da população já vive sob risco de pobreza; novas medidas de desmonte dos serviços públicos ameaçam mais de cem jornais

A imagem deste post retrata uma edição histórica. Em 31 de dezembro, Liberazione, o jornal do Partido da Refundação Comunista (PRC) italiano lançou o que pode ser seu último número impresso. Depois de circular diariamente, durante vinte anos, mantendo redação de dezenas de pessoas e cobertura dos principais fatos nacionais e internacionais, Liberazione está ameaçado de fechar. As medidas de “austeridade” decretadas pelo governo de tecnocratas chefiado pelo primeiro-ministro Mário Monti cortaram 68,8% dos recursos destinados a subsídio para jornais e revistas que compõem a diversidade editorial do país. Nada menos de cem publicações estão ameaçadas de fechar as portas. Algumas delas têm grande tradição. Por exemplo, L’Unità, fundado por Antonio Gramsci; Il Manifesto, surgido das revoltas de 1968; Avvenire, diário católico.

Liberazione é o mais diretamente ameaçado. Diante do corte dos recursos públicos, a direção do PRC julgou-se sem condições de manter a circulação do jornal em bancas. A redação insurgiu-se. Considerou tal decisão “suicida”, ocupou a sede da publicação (OccupyLiberazione), iniciou campanha de coleta de fundos e decidiu conservar a edição internet.

Subsidiar publicações não-comerciais é uma política seguida, há décadas, por diversos países europeus. O welfare-state que garantiu uma redistribuição menos desigual da riqueza coletiva a partir do pós-guerra, incluía diversas ações em favor da cultura e da liberdade de expressão. O corte aplicado por Mário Monti havia sido decidido, meses atrás, pelo então premiê Silvio Berlusconi, ele mesmo o homem mais rico da Itália e um magnata da mídia comercial.

Na edição de 30/11, matéria publicada por Il Manifesto revelava outro lado das políticas de “austeridade”. Segundo o Istat, instituto público de estatísticas italiano, o percentual de italianos em risco de pobreza ou exclusão social subiu a 25%, no final de 2010 — ano em que foram iniciada a atual onda de cortes de direitos sociais e gastos públicos. Segundo o Istat, 16% das famílias declaram “chegar com muita dificuldade ao final do mês”; e 11,5% não são capazes de aquecer adequadamente suas casas no inverno.

Já na edição de hoje, o mesmo Il Manifesto expõe como os cortes de verbas públicas atingem de modo desigual os diversos setores da sociedade. Embora seja o 10º mais volumoso do mundo, o orçamento italiano para gastos militares não perdeu um centavo, em 2012. Continua fixado em 23 bilhões de euros. A cada dois dias, o Estado gasta, com armamentos e manutenção da máquina de guerra, o equivalente ao que foi cortado dos jornais não-comerciais.

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