30/10/2013

O regresso da crise dos mercados emergentes

Satyajit Das. À revolta entre a mocidade,blogue de esquerdas de criação coletiva, tirou e traduziu este artigo de Sin Permiso (aqui).


Para parafrasear a Robert Louis Stevenson, os mercados financeiros têm "uma grande memória para esquecer".

As múltiplas crises latinoamericanas de dívida e a crise de 1997/98 no emergente mercado asiático foram esquecidas. Agora, o risco de uma crise geral nos mercados emergentes é muito real.

BRICs reais

Os investidores têm estado de romance com os mercados emergentes, como pode se apreciar nas frivolidades com as economias BRIC (Brasil, Rússia, Índia e Chinesa), um termo desenhado por Jim O'Neill, de Goldman Sachs, em 2001. Aparentemente, o pueril CRIB foi recusado a favor do solidamente construtivo BRIC ["bric" significa tijolo em inglês, enquanto "crib" é berço; T.].

Posteriormente convertido em BRICS para incluir a África do Sul, porque o anterior agrupamento carecia de referência africana, o acrónimo converteu-se em símbolo do percebido auge das nações emergentes e da sua acrecido potencial económico. A lógica e as matemáticas subjacentes eram vadias, para além da usual verba de marketing sobre o volume de população, a extensão territorial e a abundância de recursos.

Em realidade, o crescimento dos BRICS e de outros mercados emergentes estava induzido por: o baixo ponto de partida ou base do desenvolvimento, a força de trabalho sem utilizar, o trabalho barato, as estruturas de baixo custo (por causa da regulação mínima e da falta de controlos medioambientais), (em alguns casos) a riqueza de matérias primas, as elevadas poupanças nacionais e as demografias favoráveis.

Nos 90 e começos de 2000, um forte crescimento alimentado pela dívida nas economias desenvolvidas, sobretudo em EEUU e Europa, atuou como catalisador no impulso dos mercados emergentes. Uma forte demanda para as exportações combinada com a relocalização e externalização da produção para os mercados emergentes com baixos custos impulsionou o crescimento.

Uma China em rápido crescimento emergiu como um grande mercado para matérias primas, impulsionando aos países emergentes com abundantes recursos. Economias emergentes mais pequenas, especialmente na Ásia, chegaram a integrar-se nas novas correntes de oferta manufatureira centradas na China. Como escreveu David Rothkopf em Foreign Policy: "Sem China, os BRICS seriam só BRI, um queijo macio e suave conhecido sobretudo pela sua associação com o vinho que lhe acompanha."

Um círculo virtuoso empenhado em confirmar a profecia impulsionou o crescimento dos mercados emergentes melhorando os níveis de vida ao menos de alguns cidadãos.

A crise financeira global de 2007/2008 pôs fim a essa fase de desenvolvimento. A ralentização do crescimento económico nas economias desenvolvidas resultou em uma drástica queda nas economias emergentes. Para restaurar o crescimento, os mercados emergentes tenderam a modelos de crescimento mais fundados no crédito. Um crescimento de duplo dígito do crédito impulsionou a atividade económica na China, Brasil, Índia, Turquia e muitas economias da Ásia, América Latina e Europa do Leste.

BRICs irreais...

A reviviscência, impulsionada pelo crédito, das economias emergentes trouxe consigo a expansão do crédito nacional interno, dirigido pelos governos para financiar  o crescimento do investimento e o consumo. Crescimento que se viu aumentado pelos fluxos de capital foráneo, atraídos pelo que percebiam como fundamentos económicos superiores dos mercados emergentes.

As políticas monetárias laxas nos países desenvolvidos -taxas de interesse baixas ou próximas a zero, flexibilização quantitativa e desvalorização monetária- estimularam o afluxo de capital para os mercados emergentes, em procura de maiores voltas e de apreciação monetária. Os bancos, inundados de liquidez, procuraram oportunidades de empréstimos nos mercados emergentes. Os investidores internacionais, como os fundos de pensões, os gestores de investimento, os bancos centrais e os fundos soberanos, incrementaram as suas atribuições aos mercados emergentes.

A propriedade foránea da dívida dos mercados emergentes incrementou-se drasticamente. Na Ásia, o 30-50% dos bonos públicos indonésios denominados em rupias estão em mãos estrangeiras (em 2008, menos de 20%). Aproximadamente um 40% da dívida pública de Malásia e Filipinas está em mãos estrangeiras.

Os aflujos de capital impulsionaram drásticas quedas nos custos do empréstimo nos mercados emergentes. Os rendimentos do bono brasileiro denominado em dólares caíram de 25% em 2002 a uma 2,5% recorde em 2012. Depois de promediar um 7% no período 2003-2011, os rendimentos do bono turco denominado em dólares caíram a um 3,17%, outra cifra recorde. Os rendimentos do bono indonésio denominado em dólares caíram também, batendo outro recorde: 2,84%. Também caíram as taxas de juro das moedas locais.

A acrescida disponibilidade de fundos e os tipos baixos estimularam o rápido incremento dos empréstimos e do investimento especulativo. Os preços dos ativos, assinaladamente o dos bens raízes, aumentaram drasticamente.

O efeito dos afluxos de capital viu-se exacerbado pelo volume relativo do investimento e dos mercados financeiros locais. Um 1% de incremento na atribuição de carteira pelos fundos de pensões e as asseguradoras estadounidenses equivale a 500 mil milhões de dólares, uma cifra muito superior à capacidade de absorção fácil dos mercados emergentes.

A banda deixa de tocar

Nos 12 últimos meses, aumentou a preocupação dos investidores pela evolução dos mercados emergentes, o que se reflete em um crescimento reduzido e em uma potencial reversão dos afluxos de capitais.

O crescimento da China caiu por embaixo do 7%. O crescimento da Índia está por embaixo do 5%. O crescimento do Brasil está a acercar-se a zero. As predições sobre o crescimento russo foram de menos a menos, até ficar agora por embaixo do 2%. A queda reflete o estancamento económico dos EEUU, Europa e Japão. Ademais, a ralentização do crescimento chinês afetou à demanda e aos preços das matérias primas, afetado, à sua vez a produtores como Brasil. A ralentização fluiu através das correntes de oferta afetado aos suministradores da indústria manufatureira chinesa.

A ralentização do crescimento vê-se agora atenuada por saídas de capitais impulsionadas pela preocupação suscitada pelas economias dos mercados emergentes mas que alteram também a dinâmica política estadounidense.

As melhorias nas condições económicas norte-americanas estimularam uma discussão sobre a "redução" das injecções de liquidez da Reserva Federal estadounidense, que atualmente tem um monto de 85 mil milhões de dólares mensais. As taxas de juro do bónus do Tesouro norte-americano aumentaram, tendo subido os tipos do bónus a 10 anos cerca de um 1% anual (antecipando um crescimento mais robusto, mais inflação e maiores tipos oficiais de interesse). Os tipos em outros países desenvolvidos como Alemanha também aumentaram drasticamente.

À medida que os investidores reassociam os seus ativos de regresso às economias desenvolvidas, especialmente os EEUU, teve significativas saídas de capitais procedentes dos mercados emergentes, resultando em drásticas quedas do valor das moedas e vigorosos aumentos das taxas de juro creditício. Em 2013, o real brasileiro perdeu cerca de um 13%, a rupia índia, cerca de um 15%, o rublo russo, cerca de um 8%, a lira turca, cerca de um 10%, a rupia indonésia, em torno de um 12%, o ringgit malasio, em torno de um 7%, o bath tailandês, um 4% e o rand sul-africano, cerca de um 18%. Essas quedas aceleraram-se nos últimos três meses.

A capacidade de endividamento viu-se reduzida. O custo de financiamento incrementou-se. Os rendimentos dos bónus brasileiros denominados em dólares cresceram cerca de um 5%, bem por acima dos baixos níveis de 2,5% do passado ano. Os rendimentos dos bónus Turcos denominados em dólares aumentaram cerca do 6%, partindo de um modesto 3,17%. Os rendimentos dos bónus indonésios denominados em dólares estão agora acima do 6%, muito superiores àquele modesto 2,84% do passado ano.

Os bancos centrais dos mercados emergentes, excluindo a China, experimentaram saídas de reservas por um montante próximo aos 80 mil milhões de dólares (em torno do 2% das reservas totais). Nos passados 3 meses, Indonésia perdeu cerca do 14% das reservas do seu banco central; Turquia perdeu o 13%; e a Índia perdeu em torno do 6%.

Como uma maré em refluxo que deixasse ao descoberto os traiçoeiros baixos ocultos quando as águas estão altas, a relentização do crescimento e a retirada de capitais deixa agora aos vista problemas de fundo calado, especialmente elevados níveis de dívida, problemas do sistema financeiro, déficits por conta corrente e comerciais, bem como deficiências estruturais.

O romance com os BRICS degradou-se, e agora falamos de BIITS, o acrónimo acuñado para descrever os mercados emergentes atualmente mais vulneráveis: Brasil, Índia, Indonésia, Turquia e África do Sul.

Dinheiro barato, problemas caros

Os níveis de dívida nos mercados emergentes aumentaram significativamente, com um crescimento total do crédito desde 2008 que oscila entre o 10% e o 30%, segundo os países. O crescimento do crédito foi especialmente forte na Ásia. Uma dívida total em relacionamento com o PIB acima do 150-200% do PIB é agora comum. A intensidade do crédito também se incrementou drasticamente. O crédito neto que se precisa para gerar a cada dólar extra de PIB se multiplicou por dois, até se precisar agora entre 4 e 8 dólares pela cada dólar de crescimento do PIB.

O crédito bancário aumentou rapidamente e está acima dos níveis de 1997 (como percentagem do PIB) na maioria de países. Também teve um rápido crescimento nos títulos de dívida emitidos por prestamistas de mercados emergentes, tanto em moeda local como estrangeira.

O empréstito varia entre os setores, dependendo dos países. O crédito ao consumo cresceu fortemente em muitos países asiáticos e também no Brasil. A dívida de consumo em Malásia e Tailândia cresceu até situar-se em torno de um 80% do PIB, drasticamente acima dos níveis de 2007. O desenvolvimento económico vai estreitamente unido ao crescimento do crédito ao consumo. Maiores empréstitos a lares com baixos rendimentos significam maior vulnerabilidade. Em Tailândia, os pagamentos de dívidas representam já mais de 33% do rendimento, aproximadamente o duplo que nos EEUU antes da crise financeira de 2008.

O empréstito às grandes empresas varia também. Muitas grandes empresas na China, Coreia do Sul, Índia e Brasil estão muito apalancadas. A dívida bruta combinada de 10 maiores conglomerados industriais da Índia cresceu um 15% no passado ano, atingindo os 102 mil milhões de dólares. Muitos prestatários vêem-se ultrapassados por um fluxo inadequado de caixa à hora de honrar os pagamentos de interesses e principal, especialmente em um médio económico débil.

O crescimento nos mercados de dívida locais significa que as grandes empresas podem tomar prestado em moeda local, reduzindo o risco de divisas No entanto, os prestatários dos mercados emergentes, atraídos por cupões muito baixos, têm dívidas significativas contraídas em divisas fortes. Brasil tem empréstimos pendentes em dólares por um monto de 172 mil milhões de dólares (22% do PIB). Índia  tem uma dívida exterior pendente próxima ao 20% do seu PIB.

Com notáveis exceções como China e a Índia, os níveis de dívida pública não são altos. No entanto, o envolvimento do Estado nos bancos e as indústrias significa que o nível efetivo das obrigações públicas é superior ao que consta.

Os níveis sustentáveis de dívida pública são mais baixos para os países dos mercados emergentes, dadas a sua renda e riqueza per capita mais baixas. As nações emergentes caracterizam-se também por uma "estrutura de dívida investida" (um conceito atribuível a Michael Pettis no seu livro The Volatility Machine [A máquina de volatilidade]); os níveis de empréstito soberano aumentam rapidamente quando uma economia se enfrenta a problemas.

Má banca...

Bancos e investidores expostos a mercados emergentes correm riscos significativos. Tomou-se erroneamente prestado para financiar o consumo e o investimento em projetos de infraestrutura  com taxas incertas de volta ou especulação.

Com 20 biliões de dólares de todos os bónus públicos (48% dos pendentes) rendendo menos de ou em torno de um 1%, os investidores em bónus sustentaram a prestatários de uns mercados emergentes a cada vez mais marginais com preços por baixo do risco

Uma emissão de bónus a 10 anos por 400 milhões de dólares do estado africano de Ruanda com um cupão de 6,875% teve uma sobre-subscrição dentre nove e dez vezes maior. Os fundos conseguidos (cerca de um 5% do PIB) iam financiar um centro de convenções em Kigali, Ruanda. Panamá emitiu bónus a 40 anos ao 4,3%, um resultado notável dado que os bónus do tesouro norte-americano apenas se venderam por embaixo do nível de cupão para o 10% da história. Honduras foi capaz de emitir bónus a 10 anos para conseguir 500 milhões, apesar de que se enfrenta a grandes dificuldades para honrar as suas obrigações.

Em muitos países emergentes, os servidores públicos dos bancos quase-públicos financiaram projetos patrocinados pelas elites e os empresários politicamente promiscuos. As práticas crediticias foram débeis, ajudando a financiar as propriedades caras e a permitir projetos vaidosos duvidosamente económicos.

Muitos prestatários brigarão para pagar a dívida. As perdas ocultam-se normalmente por uma política oficialmente sancionada de reestruturação da carteira vencida. Os empréstimos maus ou reestruturados dos bancos índios chegam já ao 12% do total de ativos, o duplo que faz quatro anos. No Brasil, os problemas de solvência do antigo magnata Eike Batista e os seus vários negócios resultarão em grandes perdas para os prestamistas, bem como para o banco do desenvolvimento, um banco público brasileiro.

Problemas no estrangeiro...

Os afluxos de capital foráneo em curto prazo financiaram as contas externas, maquilhando os balanços subjacentes.

O excedente por conta corrente dos países de mercados emergentes caiu até o 1% do PIB conjunto; em 2006 rondaba o 5%. O deterioro é maior, pois os excedentes comerciais da China  e dos exportadores de energia distorceram o resultado geral. As quedas refletem a relentização do crescimento dos mercados de exportação, a diminuição dos preços das matérias primas, o aumento dos preços de importação dos alimentos e da energia, bem como o consumo interior impulsionado pelo excessivo crescimento do crédito.

Índia, Brasil, África do Sul e Turquia têm grandes déficits por conta corrente que devem se financiar em ultramar. Índia tem um déficit por conta corrente por volta dos 6-7% e um déficit orçamental (governo federal e dos estados federados) próximo aos 10% que precisa de financiamento. Os países dependentes da exportação de matérias primas são também vulneráveis, dados a queda de preços e o anémico crescimento económico global.

Os países emergentes precisam em torno de 1,5 biliões de dólares anuais em financiamento externa para subvir às suas necessidades financeiras, incluída a dívida próxima a vencimento. Um deterioro do ambiente de financiamento combinado com uma queda das reservas de divisas, redução da abrangência para as importações e os empréstitos em curto prazo, moedas em declive e minguadas perspetivas económicas incrementaram a sua vulnerabilidade.

Problemas em casa...

O difícil ambiente exterior pôs ao descoberto inveteradas debilidades estruturais.

Os investidores temem que muitos mercados emergentes fiquem atrapados em uma armadilha de rendimentos médios, onde os países experimentam um drástico declive no crescimento económico quando o PIB per capita chega aos 15.000 dólares.

As economias emergentes seguem estreitamente unidas às economias desenvolvidas através do comércio, da necessidade de capital para o desenvolvimento e do investimento das reservas da mudança exterior, que totalizam um excedente de 7,5 biliões de dólares. O débil crescimento nos mercados desenvolvidos e a decrescente qualidade crediticia dos bónus soberanos dos países desenvolvidos podem resultar perjudiciais para os mercados emergentes. Os países emergentes perderam também competitividade, um resultado dos custos crescentes, particularmente do trabalho.

Os investidores preocupam-se pelo mau investimento e pela falta de investimento. Os projetos troféu como os Jogos Olímpicos de Beijing (com um custo de 40 mil milhões de dólares), as Olimpíadas de inverno russas em Sochi 2014 (51 mil milhões) e a Copa do Mundo de Futebol em 2014  e Olimpíadas em 2016 no Brasil absorveram recursos escassos a expensas de infraestruturas essenciais.

A desigualdade de rendimentos, a corrupção, os ambientes hostis e difíceis para os negócios, a excessiva concentração do poder económico em corporações estatais muito subsidiadas e as rigidezes políticas complicam crescentemente os problemas de dívida e saídas de capital. A instabilidade política exacerba os problemas económicos, por exemplo, no Brasil, Turquia, África do Sul e a Índia.

Essas preocupações deram pé a um novo acrónimo para os mercados emergentes mais vulneráveis; BIITS (Brasil, Índia, Indonésia, Turquia, África do Sul). Diríase que os BRICS se estão a converter em BIITS!

Momento da verdade...

Os políticos cansos de batalhas não querem achar sequer na possibilidade de uma crise dos mercados emergentes. Acham, como o antigo Secretário de Estado norte-americano Henry Kissinger, que "não pode ter uma crise na semana que vem; a minha agenda já está cheia".

O verdadeiro é que há espantosos parecidos com os 90. Então, políticas monetárias laxas promovidas pela Reserva Federal estadounidense e o Banco do Japão trouxeram consigo enormes afluxos de capital aos mercados emergentes, especialmente na Ásia. Em 1994, o presidente da reserva Federal Alan Greenspan retirou a liquidez, o que redundou em umas taxas de juro estadounidenses que se multiplicaram por duas em 12 meses.

Na conhecida como "Grande Massacre dos Bonos" de 1994, os tedores de bónus estadounidenses sofreram perdas por volta dos 600 mil milhões. As perdas na negociação de bónus levaram à bancarrota do Orange County em Califórnia, ao fechamento de Kidder Peabody e à quebra de muitos fundos de investimentos. Desencadeou crise de mercados emergentes em México e América Latina. Precipitou a crise monetária asiática, que precisou da intervenção do FMI para resgates na Indonésia, Coreia do Sul e Tailândia. Ásia precisou mais de uma década para recuperar das perdas económicas.

Muitos temem agora uma repetição disso disparada pelas rápidas saídas de capital e ainda dólar à alça. A trajetória básica é familiar: as velhas vias são com frequência a melhor via.

As debilidades na economia real e as vulnerabilidades financeiras retroalimentar-se-ão rapidamente em um círculo vicioso. Ainda se se diferira a redução da excessiva laxitude monetária nas economias desenvolvidas, o verdadeiro é que as fragilidades fundamentais dos mercados emergentes -os déficits por conta corrente, as inadequadas voltas dos investimentos e os elevados níveis de dívida- revelar-se-ão problemáticas.

As retiradas de capital causarão debilidade da moeda, ou que à sua vez induzirá caídas nos preços de ativos como os bónus, as ações e as propriedades imobiliárias. Uma diminuída disponibilidade financeira e uns crescentes custos de financiamento incrementarão a pressão sobre prestatários sobreendividados, o que disparará os problemas bancários e repercutirá, assim, na economia real. As degradações da qualificação do crédito e do investimento estenderão o ciclo através de repetições iteradas.

As respostas políticas complicarão os problemas

Compra-las de divisas, as intervenções no mercado monetário ou os controlos de capitais por parte dos bancos centrais reduzirão as reservas ou acelerarão as saídas de capital. Taxas de juro mais elevadas para sustentar a moeda e contrarrestar a inflação importada reduzirão o crescimento, exacerbando os problemas dimanantes de uma dívida elevada. Índia, Indonésia, Tailândia, Brasil, Peru e Turquia já puseram por obra algumas dessas medidas.

Uma moeda mais débil afetará os preços dos produtos de primeira necessidade, alimentos, azeite de cozinha e gasolina. Os subsídios para manter baixos os preços debilitarão as finanças públicas. A necessidade de sustentar o sistema financeiro e o conjunto da economia exercerá uma grande pressão sobre as balanças públicas.

A gentalha aficionada ao "desta vez é diferente" sustenta que se fez já em frente às vulnerabilidades críticas -taxas de mudança fixas, baixas reservas de mudança exterior, endividamento em moeda estrangeira-, evitando o risco da familiar espiral da morte nos mercados emergentes. É um ponto de vista manifesta e exageradamente otimista. Pode que as mudanças estruturais atrasem o estourido da crise. Mas a economia real e as debilidades financeiras apontam a que os riscos são elevados.

Enquanto a dívida em moeda local aumentou, os níveis de dívida em moeda estrangeira sem abrangência são significativos. Onde a dívida é denominada em moeda local, a propriedade foránea é significativa, especialmente em Malásia, Indonésia, México, Polónia, Turquia e África do Sul. As debilidades da moeda causarão a saída de investidores estrangeiros, o que aumentará os custos do empréstimo e reduzirá a capacidade de financiamento.

As debilidades fundamentais e um ambiente exterior débil limitam as opções políticas. A capacidade de assistência do FMI vê-se limitada por causa de crises concorrentes, especialmente na Europa.

Retrocesso económico...

Na reunião de banqueiros centrais que teve local em Jackson Hole em agosto de 2013, os políticos ocidentais negaram o papel jogado pelas economias desenvolvidas nos problemas a que agora se enfrentam os mercados emergentes e sustentaram que os seus políticos teriam "beneficiado" os mercados emergentes. Mas as economias desenvolvidas enfrentam-se agora a um sério retrocesso económico.

Desde 2008, os mercados emergentes contribuíram em 60-79% ao crescimento económico global. Uma relentização afetará rapidamente às economias desenvolvidas. Baixará a demanda de exportações que promoveram até agora a atividade económica. Cairão os rendimentos das empresas transnacionais à medida que declinem os seus rendimentos por operações em ultramar. As perdas em investimentos afetarão aos fundos de pensões, aos gestores de investimentos e aos investidores individuais. As perdas crediticias e comerciais afetarão aos bancos internacionais ativos nos mercados emergentes.

Os mercados emergentes têm em torno de 7,4 biliões de dólares em reservas de divisas investidas primordialmente em títulos públicos estadounidenses, japoneses, europeus e britânicos. Se os bancos centrais dos mercados emergentes vendem títulos a fim de apoiar as suas débeis moedas ou de sustentar à economia nacional, então o drástico incremento das taxas de juro atenuará o incremento decorrente da redução de estímulo monetário. Isso resultará em grandes perdas imediatas para os tedores. Também incrementará a tensão financeira, repercutindo negativamente na frágil recuperação das economias desenvolvidas.

A debilidade das moedas dos mercados emergentes está a impulsionar uma subida nas moedas principais, como o dólar. Isso erosionará as melhorias em estruturas de custos e em competitividade conseguidas através da avaliação da moeda com baixas taxas de juro e flexibilização quantitativa. O dólar mais alto truncará qualquer recuperação incipiente.

Com o tempo, o efeito desestabilizador das ações nacionais e complexas correntes políticas cruzadas podem acelerar a tendência a fechar das economias, magoando as perspetivas de crescimento global.

Em realidade, o que as economias desenvolvidas procuraram exportar é mais que bens e serviços: trataram de exportar as cargas do ajuste requerido pela crise de 2008 para as economias emergentes. Como um homem a ponto de se afogar que se agarra a outro que mal sabe nadar, as políticas seguidas bem poderiam trazer consigo o hundimiento de uns e de outros, das economias desenvolvidas e das economias emergentes.

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