05/11/2010

É hora de chamar-lhe à luta de classes polo seu nome

David Rosen. Artigo tirado de Sin Permiso na sua ediçom electrónica. Pode-se consultar em castelhano aqui, a traduçom para o galego é de nosso. David Rosen é um analista político norte-americano.

As grandes palavras não pronunciadas do discurso político norte-americano são "luta de classes". A premisa moral e política do moderno "Século Norte-americano" surgido da II Guerra Mundial é que os EEUU teriam superado as divisões de classe e a luta de classes. Todos, ou quase todos, salvo os muito pobres e os muito, muito ricos, foram absorvidos por uma vastísima e indiferenciada classe média.

A ficção, segundo a qual Norteamérica é uma nação sem classes, uma lenda mentirosa desde seu nascimento faz meio século, resulta a cada vez mais insustentável, à medida que se intensifica dia após dia a luta de classes. Chegou a hora de aceitar o singelo mas profundo facto de que Norteamérica se acha no meio de uma guerra de classes: e os arquiricos, a secção norte-americana da oligarquía global, estão a ganhá-la.

Na França e em Grã-Bretanha, a luta de classes livra-se explicitamente. Na França expressa-se em forma de resistência em massa e com freqüência violenta, com sangue nas ruas. No Reino Unido impõe-se em forma de exigência de austeridade por parte da classe dominante através despedimentos em massa no sector publico, recortes ciclópeos nos serviços públicos e escassa resistência aberta. Em Alemanha e nos EEUU, os lubricantes mediadores constituídos pelas subtilezas dos mídia e os partidos políticos seguem contendo e amortecendo o conflito directo de classes.

A extrema direita é em todo o Occidente a única tendência política explicitamente comprometida com a guerra de classes. No entanto, na extrema direita não se vê à política como um mero fim em se mesmo (a conquista do poder do estado), senão como médio para um fim de maior alcance: a utilização do poder do Estado para impor ao corpo político disciplina legislativa, económica e moral.

O Tea Party é um movimento popular comprometido a guerra de classes, normalmente não violenta. É a voz dos cristãos vulneráveis das classes baixa e médias. Seu mundo está em crise, e assistem ao sua colapso. Seus outrora envidiáveis privilégios sociais dimanantes de sua raça já não lhes protegem dos vicisitudes do capitalismo grande empresarial. Como reacção a isso, se reatrincheran na segura fortaleza do ódio e se alinean com o absolutismo ideológico e moral promovido por algumas facções dos ricaços, precisamente os maiores responsáveis de suas misérias.

A luta de classes foi um rasgo inveterado da cultura política norte-americana. Batalhas de classe marcaram o primeiro período de formação da nação, incluídas as insurrecciones dos aparceros de Nova York em 1766, a Rebelião de Shay em 1786 e a Rebelião do Whisky na década de 1790. Batalhas de classe atravessaram no século XIX, incluindo o Movimento dos Homens Trabalhadores da década de 1830 e a Revolta de Nat Turner em 1831, bem como as lutas populistas posteriores à Guerra Civil em Haymarkey e em Homestead no último trecho do XIX e o Exército Coxey de trabalhadores desempregados em 1894. As batalhas de classe cruzaram também o primeiro terço do século XX, culminando na Marcha de Veteranos da I Guerra Mundial, a resistência dos camponeses e granjeiros à as execuções hipotecarias e as greves dos sindicalistas da CIO na década dos 30.

As classes e a guerra de classes fizeram-se desaparecer oficialmente durante a II Guerra Mundial, e efectivamente desapareceram com a integração do sindicalismo e a legislação Taft-Hartley após a guerra. O programa nacional de prosperidade e o anticomunismo de impronta maccarthysta, combinados com a campanha exterior de intervenção militar da Guerra Fria e a renovação económica do Plano Marshall, sentaram as bases de uma revitalización do ordem capitalista.

Este sistema de valores do novo ordem mundial, que absorvia a luta de classes, foi articulado por um grupo de intelectuais liberais "pós-marxistas" entre os que se achavam Daniel Bell, Sidney Hook, James Burnham e Irving Kristol. Respaldados pelo Congresso para a Liberdade Cultural da CIA, foram eles que forjaram a ideologia do "Século Norte-americano". Como escreveu Bell: "A abundância? foi o substituto norte-americano do socialismo".

E desde aquela, Norteamérica conseguiu a abundância nas primeiras décadas de posguerra. Com a crise do petróleo e a recessão dos 70, no Século Norte-americano começou a declinar. Em meados dos 80, a abundância era já coisa do passado. Como David Bloom, um economista de Harvard, advertiu em 1986: "Produziu-se um encogimiento da classe média. À medida que a sociedade se polariza mais, há mais 'poseedores" e mais 'desposeídos', e menos gente em médio." [Time, 3 novembro 1986.]

Desde a Revolução de Reagan, a abundância da classe média foi crescentemente substituída por dívida. Com Reagan desapareceram as luvas de seda que durante tanto tempo amorteceram a guerra de classes. A promessa do Século Norte-americano languidece, e os ricos são a cada vez mais ricos e as classes médias trabalhadoras estão a cada vez mais esquilmadas.

Num poema escrito em 1894, o autor inglês Lord Alfred Douglas referiu-se à homosexualidad como ao "amor que não ousa dizer seu nome". Em 1895, Oscar Wilde foi julgado e condenado por sodomía; durante o processo, requereu-se-lhe pára que se definisse em relação com o poema de Douglas, o que contribuiu a popularizar a expressão. Num século depois, na homosexualidad em Occidente é já, em general, um amor que não teme dizer seu nome.

Faz num século, a guerra de classes reconhecia-se comummente como um rasgo distintivo da modernização norte-americana. Grandes conglomerados industriais, encabeçados por Standard Oil, dominavam o sistema económico e político norte-americano; e aos magnatas que os dirigiam lhos conheciam com o jocosamente despectivo sobrenombre de "barones ladrões". Dada essa situação de opresión, a guerra de classes era um conceito político aceitado de consuno pelo jornalismo de denúncia, o radicalismo, o sindicalismo e o povo trabalhador comum e corrente. Todo mundo sabia que a única forma de lutar contra os conglomerados monopólicos e os barones ladrões era através da guerra de classes.

Hoje, a luta de classes não ousa já dizer seu nome. O capital financeiro veio a substituir ao capital industrial como factor determinante da economia global. E um dos progenitores da Standard Oil, Citibank, influi de maneira determinante nas decisões federal de política económica. Desgraçadamente, os actuais archiricos, já sejam membros de clubs exclusivos de ricachões, financiadores do Partido Republicano, mecenas de think tanks de extrema direita ou subsidiadotes do movimento "populista" do Tea Party, raramente são desprezados e ridiculizados como barones ladrões.

Os actuais barones ladrões conhecem a importância dos meios de comunicação, e têm sobornado aos formadores da opinião popular. Bem trajeados executivos empresariais e financeiros, não moralmente melhores que arteiros rouba-bilheteiras, foram convertidos em celebridades. São lisonjeados até a náusea em reality shows televisivos, alabados a diário em programas e noticiarios económicos e sensacionalistamente engrandecidos dia sim e outro também na imprensa rosa. Os grandes meios de comunicação norte-americanos, óbvio é dizê-lo, não querem morder a mão que lhes dá de comer.

O de classe, e particularmente o de classe média, é um conceito que se fez vagaroso no discurso político norte-americano. Refere-se a todos e a nenhum. O Escritório do Censo norte-americana não define, nem usa, a noção de "classe média", mas fixou o rendimento médio de uma família de quatro em 2008-2009 em 70.000 dólares anuais. Uma investigação do instituto Pew em 2008 mostrou que a metade dos norte-americanos se definem a si mesmos como de classe média.

O grosso dos norte-americanos reconhecem a realidade da luta de classes, por um lado, nas incesantes informações referidas aos elevados níveis de desemprego, ao número a cada vez maior de execuções hipotecarias e à crescente morosidad, e, pelo outro, nos disparados mercados de valores e os indecibles bonos pagos aos executivos financeiros. Isso põe ante a rotunda evidência das diferenças de classe, mas resulta um tanto confundente respecto do conflito, mais profundo, dimanante da acrecida polarización da riqueza em Norteamérica.

De acordo com Edward Wolff, um economista da Universidade de Nova York, a riqueza a cada vez está mais concentrada. Nos 15 anos que median entre 1983 e 2007, a participação na riqueza nacional de 1% mais rico cresceu de 33,8% a um 34,6%; e o mais 20% rico dos lares norte-americanos em 2007 controlava o 85% da riqueza nacional, enquanto em 1983 só controlava o 81,3%. O destino da vasta "classe média" norte-americana, o restante 80%, não fez senão piorar: em 2007 controlava um 15%, contra um 18,7% em 1983.

É hora de que Norteamérica volte a chamar à luta de classes por seu nome. Por duas razões. Primeiro, para poder combater o expolio que está a arruinar as vidas de milhões de norte-americanos enfrentados à catástrofe financeira. E segundo, para pôr fim à campanha dos archiricos (mancomunada com as políticas públicas de desfravación fiscal, subsídios e outros presentes) e dos meios de comunicação para manter viva a ficção de que os EEUU são uma sociedade sem classes e livre de guerra de classes.

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