Tunísia: Palácio presidencial
A resposta mais simples e talvez mais acurada à sua pergunta veio há quase um século de um poeta tunisino Abu Al-Qasem Al-Shabi (Schebbi), no seu Defenders of the Homeland, verso que se tornou o mais popular da poesia árabe e está no hino nacional da Tunísia: “Quando um povo decide viver, o destino se rende, e (...) rompem-se as cadeias da escravidão”.
Diferente do levantamento na vizinha Argélia, que teve vida curta e outros recentes protestos socioeconómicos em outros países árabes, o levantamento popular na Tunísia recebeu apoio imediato de todos os grupos da oposição, dos islâmicos aos comunistas, e dos sindicatos, que ajudaram a levar o movimento para outras partes do país, inclusive até o norte, tão influente.
Além disso, o alto grau de tensão que se acumulou depois de décadas de ditadura, sobretudo nos últimos 23 anos de governo de Ben Ali, que comandava um Estado policial, levou a situação a explodir no instante em que se abriu a caixa, nos primeiros dias de protestos contra o desemprego.
(2) Como se explica que um regime opressor e impopular não seja alvo de críticas da comunidade internacional?
A chamada comunidade internacional mantém-se tradicionalmente calada contra práticas e abusos totalitários dos seus Estados membros e aliados, excepto nos casos em que alguns países e poderes ocidentais invocam questões de opressão política praticada por um ou outro governo, utilizando essas questões como ferramentas de política externa, ou para mostrar-se ao mundo, como produto de consumo, travestida em campeão da luta por direitos humanos.
Assim, quando regimes opressores, como o que havia na Tunísia, cooperam com os Estados ocidentais em questões económicas ou estratégicas, os abusos e crimes que cometam são em geral ignorados.
Esse é o factor que melhor explica o silêncio dos líderes ocidentais, ou a confusão inicial de alguns sobre o “levantamento” tunisino, como também explica o imediato apoio que deram ao “levantamento” da oposição no Irão, depois das eleições de 2009. Pode chamá-lo de “factor hipocrisia”.
(3) Mas o que a Tunísia tem a oferecer às potências ocidentais?
O presidente recém deposto da Tunísia foi aliado útil dos EUA e de líderes europeus na guerra contra o terrorismo e contra o extremismo islâmico.
Como inúmeros grupos de direitos humanos noticiaram repetidas vezes, aquele governo sempre usou o apoio que recebia do ocidente, como arma para atacar toda e qualquer oposição interna, mesmo que pacífica.
Sarkozy, da França, fez o mesmo, em 2008, elogiando as reformas “na esfera das liberdades”, quando era regra, na Tunísia, o abuso de direitos humanos. Num único evento, cerca de 200 pessoas foram condenadas, naquela época, por participação em protestos socioeconómicos, na cidade mineira de Redhayef, no sul da Tunísia.
E quando alguns funcionários de países europeus criticavam os atentados aos direitos humanos na Tunísia, quase todos, simultaneamente, elogiavam o desempenho económico do país.
A França é o principal parceiro comercial da Tunísia, e o quarto maior investidor estrangeiro no país; e 80% do comércio exterior da Tunísia é com a União Europeia.
Parece evidente que a abertura descontrolada da economia neoliberal aos investimentos ocidentais é factor de peso, que explica a deterioração da situação económica na Tunísia e noutros países árabes.
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