Egipto: Greve dos trabalhadores dos transportes públicos, protesto junto do Ministério do Interior
Cairo, Egipto, 16/2/2011 – Hosni Mubarak cometeu, nos últimos cinco anos, um dos maiores erros dos seus 30 anos como presidente do Egipto, o de não aprender as lições das centenas de pequenas greves registadas nesse período. Isso custou-lhe o poder. Estes factos foram os verdadeiros precursores do levantamento que começou em 25 de Janeiro e no dia 11 pôs fim a um governo de três décadas (1981-2011).
“Tivemos sorte pelo facto de, na sua arrogância e atitude distante, o regime não ter aprendido nenhuma lição com as muitas greves e os muitos protestos que aconteceram nos últimos cinco anos”, disse Mohammad Fathy, sindicalista de 46 anos radicado na cidade de El-Mahala, cuja candidatura para a União Geral de Trabalhadores – patrocinada pelo governo – foi dificultada pela sua opinião contrária ao regime.
“Fomos, inclusive, mais sortudos por eles, os governantes, não compreenderem que havia genuínos problemas económicos, profissionais e de trabalho, especialmente aqui, em El-Mahala, no dia 6 de Abril de 2008”, disse Mohammad. Nessa data, o Egipto experimentou o primeiro exemplo em décadas de uma acção sindical que se converteu num levantamento popular, uma mini-revolta nas ruas desta cidade industrial que atraiu homens, mulheres e crianças.
Foi aqui que os activistas pelos direitos do trabalho organizaram dois dias de protestos maciços, nos quais os moradores do lugar deixaram as suas casas e retiraram imagens e cartazes de Mubarak, pela primeira vez desde a sua chegada ao poder. Estes factos assinalaram o nascimento do grupo de activistas anti-Mubarak na Internet, o Movimento 6 de Abril, que tomou o seu nome desse dia histórico. Quase três anos mais tarde, esse grupo ajudou a organizar os acontecimentos do dia 25 de Janeiro. Desta vez, não só retirou as imagens de Mubarak, como também o próprio presidente.
Se Mubarak tivesse tomado nota dos protestos sindicais, poderia ter aprendido algumas maneiras de prevenir ou frustrar a revolução de 25 de Janeiro, afirmam vários dirigentes sindicais. “A reacção dos partidários de Mubarak foi a de que nós éramos apenas um punhado de jovens que podiam ser facilmente abatidos pela polícia. A sua única resposta foi cada vez mais segurança, nada político e nada económico. Eles não se deram conta de quanto alterada estava a força de trabalho do país”, disse Fathy. De facto, essa força continua alterada mesmo após o derrube de Mubarak.
Anos de assédio policial, políticas desfavoráveis aos trabalhadores e más condições económicas deixaram profundas cicatrizes nos operários egípcios, que até agora sentem que ficaram fora do lugar que lhes corresponde. Assim, não surpreende que as manifestações sindicais tenham continuado, exortando o Conselho Supremo das Forças Armadas, que governa o país, a emitir o seu quinto comunicado, chamando especificamente os dirigentes deste sector a atenuarem seus protestos.
O governo interino de Ahmed Shafiq queixou-se ao Conselho Supremo de que as contínuas greves não ajudam esta nação de 85 milhões de habitantes a voltar à normalidade. Quase todos os sectores da economia são afectados. O Banco Central teve de conceder um feriado bancário improvisado no dia 14, que se somou ao feriado religioso de 15, numa aposta para frustrar as crescentes greves no sector, cujos trabalhadores pedem a investigação dos altos salários dos principais executivos. Inclusive, a polícia culpa os seus baixos salários para explicar a corrupção dentro dessa força, e pede mais benefícios no trabalho.
Esta onda de greves posteriores à queda de Mubarak coloca em relevo a divisão existente entre os líderes sindicais, os que querem benefícios imediatos para os trabalhadores e aqueles que querem dar tempo ao novo governo provisório para atender as suas reivindicações. Isto não quer dizer que o sector operário deixa de lutar por seus direitos, disse o ferroviário Mohammad Mourad, sindicalista de El-Mahala.
O ferroviário disse que a queda de Mubarak é uma boa notícia para a força de trabalho do país, já que significa o fim de algumas das políticas desfavoráveis aos trabalhadores. Entre elas, mencionou especificamente as privatizações de empresas estatais – o que sabotou as eleições sindicais – e a interferência policial como obstáculos que desaparecerão junto com a queda de Mubarak. Embora seja possível que isto aconteça, de todo modo não oferece um alívio imediato para os trabalhadores impacientes.
Em El-Mahala, o salário mínimo médio dos 25 mil trabalhadores têxteis da Egyptian Spinning & Weaving Company, a maior fábrica têxtil do Médio Oriente, é de apenas 102 dólares. A maioria dos funcionários acaba por procurar outros empregos para completar o rendimento. Para que essa situação mude, sugerem que o novo governo confisque milhares de milhões de dólares dos membros corruptos do regime anterior e os invista em benefícios para os trabalhadores. Mubarak gastou muito dinheiro em segurança, e esses fundos também poderiam ir para os trabalhadores pobres, segundo o sindicalista Hamdi Hussein.
Os dirigentes sindicais afirmam que a maioria das greves e dos protestos dos trabalhadores tem três objectivos: pôr fim à corrupção nas altas esferas de algumas empresas, aumentar o salário mínimo para pelo menos 255 dólares e realizar eleições sindicais livres. “Se essas três reclamações não forem atendidas logo, os trabalhadores continuarão a agir até que a revolução signifique uma mudança real para eles”, disse Hamdi, que trabalha para o Comité Coordenador para as Liberdades e os Direitos do Trabalho.
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