O prémio Nobel da Economia, Paul Krugman, defende, em artigo publicado no New York Times, que a crise da dívida já não é apenas um problema de países pequenos e periféricos como a Grécia e acusa os líderes europeus e o BCE de não estarem a reconhecer a verdadeira natureza do problema.
Krugman: “Numa altura em que a Europa precisa desesperadamente de uma forte recuperação, e uma inflação modesta poderia ajudar, o banco central europeu está a apertar a política monetária, tentando afastar riscos inflacionistas que só existem na sua imaginação”.
Num artigo de opinião publicado este domingo no The New York Times, intitulado “Um desastre impecável”, Paul Krugman começa por criticar as declarações recentes de Jean-Claude Trichet, presidente do Banco Central Europeu (BCE), que, na sua última conferência de imprensa, defendeu a actuação da autoridade monetária europeia como “impecável, impecável” na manutenção da estabilidade dos preços. Adivinha-se então a ironia contida no título do artigo.
O BCE salvaguardou, de facto, de forma impecável a estabilidade dos preços, afirma Krugman, comentando as declarações Trichet, para depois concluir que “ é por isso que o euro está agora à beira do colapso”.
Para o economista que ganhou o Prémio Nobel da Economia em 2008, a turbulência que tomou de assalto a Europa “já não é apenas um problema dos países pequenos e periféricos, como a Grécia”. “O que está em causa é um ataque a grande escala a economias muito maiores, como a Espanha e Itália”, que, pela sua dimensão (estas economias equivalem a um terço do PIB da zona euro), colocam a moeda europeia sob “ameaça existencial”.
O cenário tem tendência para se agravar, aponta Krugman, porque os líderes europeus “não estão dispostos a reconhecer a natureza da ameaça, muito menos a lidar com ela de forma eficaz”.
O “conto moral de endividamento e castigo” dos líderes europeus
Para o economista, os líderes europeus e, sobretudo, a Alemanha, tendem a reduzir a crise da dívida a um “simples conto moral de endividamento e castigo” que se traduz na lição: os Governos endividaram-se em demasia, agora têm de pagar a factura, e a austeridade é a única solução.
Todavia, segundo Krugman, esta lógica aplica-se, quando muito, à Grécia. O economista dá como exemplo o caso de Espanha, que tinha um excedente orçamental e baixos níveis de endividamento antes da crise de 2008, e refere-se também à Itália que, apesar de ter um nível elevado de dívida, tem um défice relativamente baixo.
O economista critica ainda a actuação do BCE, defendendo que deveria ter começado mais cedo a comprar dívida de Espanha e Itália, visto que estes dois países não têm moeda própria e, por isso, não podem criar dinheiro para comprar dívida por si mesmos.
Krugman sublinha o facto de, nas últimas semanas, o BCE se ter lançado na compra de títulos destas economias, embora saliente que isso o tenha colocado rapidamente “sob a pressão severa dos moralizadores”, nomeadamente da Alemanha. Isso generalizou a percepção de que “os moralizadores irão bloquear quaisquer acções futuras de resgate”, gerando um pânico renovado no mercado.
Há ainda outro problema: “a obsessão do BCE em manter a sua actuação impecável em matéria de estabilidade de preços”. “Numa altura em que a Europa precisa desesperadamente de uma forte recuperação, e uma inflação modesta poderia ajudar, o banco central está a apertar a política monetária, tentando afastar riscos inflacionistas que só existem na sua imaginação”.
O artigo de Krugman termina com um alerta - “Não estamos a falar de uma crise que se vai revelar em um ano ou dois, a situação pode resvalar numa questão de dias. E, se assim for, o mundo inteiro irá sofrer”.
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