20/09/2010

Ciganos à beira do caminho

David Cronin. Artigo tirado de aqui.



Na entrada de um acampamento cigano nesta cidade do norte da França pode-se ver bicicletas quebradas e malas velhas. Meninos e meninas, com barro até os tornozelos, pegam a mão do jornalista da IPS e o levam onde estão seus pais. Diante da pergunta se tem medo de ser expulsa, Elena, uma das integrantes do acampamento, mostra sua carteira de identidade na qual se lê que é da Romênia, país membro da União Europeia, como a França. Elena e sua família, bem como outros ciganos da França, correm o risco de serem expulsos a qualquer momento.
No centro de Villeneuve d’Ascq, uma comunidade pobre de Lille, pode-se ler em uns paineis os artigos da Declaração Universal dos Direitos Humanos. “Toda pessoa tem direito a um nível de vida adequado”, diz um cartaz. “Ninguém será privado arbitrariamente de sua propriedade”, afirma outro. É evidente que no acampamento dos ciganos, não muito longe dali, são violados esses direitos, considerados fundamentais pela Organização das Nações Unidas.
Não há adequadas instalações sanitárias e nem água corrente, meninas e meninos urinam num canto de um estacionamento vizinho. O risco de que o acampamento, com suas seis casas rodantes, seja desmantelado é real. Há algumas semanas foram usados tratores para desmantelar outro assentamento cigano próximo. “Temos muitos problemas com a polícia”, disse Vasir, morador do acampamento. “Eles vêm muitas vezes. Não temos trabalho, nem dinheiro, nem nada”, afirmou.
Os esforços das autoridades francesas para expulsar os ciganos se concentraram na cidade de Lille e seus arredorees. O Presidente da França, Nicolas Sarkozy, acusou os estrangeiros de serem delinqüentes em um discurso feito em julho. Também disse que não seriam “tolerados” os acampamentos ciganos.
Na primeira operação policial contra os ciganos após o discurso do chefe de Estado foi na comunidade de Lesquin, perto de Lille. Quarenta e oito pessoas e 14 casas rodantes foram “evacuadas”, segundo retórica oficial. Foi a primeira medida que prosseguiu com a expulsão de mil ciganos em agosto. Nove adultos e 12 menores foram tirados de suas casas rodantes na última semana de agosto, segundo as autoridades, por ocuparem propriedade privada.
A medida gerou reações na justiça e na sociedade civil. Um tribunal de Lille deu duas sentenças contra o argumento de que os acampamentos ciganos são uma ameaça à ordem pública. Houve protestos nesta cidade contra a política de Sarkozy com os ciganos e a reforma da segurança social. É uma vergonha para a França, segundo os manifestantes. A difícil situação dos 1.200 ciganos em Lille e seus arredores também é motivo de disputas entre os partidos políticos.
Depois das críticas contra a expulsão de ciganos feitas pela primeira-secretária do opositor Partido Socialista, Martine Aubry, os aliados centro-direitistas do Presidente a acusaram de manter um duplo discurso, porque com prefeita desta cidade propôs, no começo deste verão, desmantelar os acampamentos.
Uma norma da UE de 2004 proíbe deportações coletivas de um país do bloco para outro. Mas as autoridades da Comissão Europeia, com sede em Bruxelas, são reticentes em tomar medidas contra a França. Seu presidente, José Manuel Barroso, não fez nenhum comentário sobre o assunto em seu primeiro discurso dedicado à situação da UE no último dia 7. Barroso se mostrou reticente apesar de o tratamento dispensado aos ciganos ter sido amplamente discutido entre França e Comissão Europeia nas semanas anteriores.
A comissária de Justiça da União Europeia, Viviane Reding, tampouco quis fazer declarações públicas sobre a França ter infringido uma norma do bloco, embora os informes internos preparados por seu escritório assim sugerirem. Um dos documentos afirma que as deportações não foram voluntarias, como alegam as autoridades francesas. Também diz que indenizar os deportados com pequenas quantias de dinheiro não basta para afirmar que a França respeitou a legislação da UE sobre a livre circulação de pessoas.
O Parlamento Europeu, único órgão eleito por votação popular, estava em recesso em agosto e não se manifestou sobre as deportações. A assembléia aprovou uma resolução contra a política francesa quando reiniciou as sessões, na semana passada. O texto da resolução, aprovada por 337 votos contra 245, rechaça “toda declaração que relacione minorias e imigração com criminalidade e crie estereótipos discriminatórios”.

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