10/10/2010

A China e a nova orde mundial (II)

Noam Chomsky. Artigo tirado de aqui. Ilustraçom de Javier Jaén. A traduçom desde o castelhano para galego-português é nossa.


De todas as "ameaças" à orde mundial, a mais consistente é a democracia - a menos que esteja baixo algum controlo imperial - e, mais geralmente, a afirmaçom da independência. Estes temores guiárom o poder imperial ao longo da história.

Em Latinoamérica, tradicional celeiro de Washington, os sujeitos som cada vez mais desobedientes. Os seus passos para a independência experimentárom um avanço adicional no fevereiro passado com a formaçom da Comunidade de Estados de América Latina e o Caribe, que abrange a todos os países do hemisfério excepto os EUA e Canadá.

Por vez primeira, desde as conquistas espanhola e portuguesa há mais de 500 anos, América Latina está avançando para a integraçom, um pré-requisito para a independência. Também está começando a resolver o escándalo interno dum continente dotado de ricos recursos, mas dominado por diminutas ilhas de elites abastadas num mar de miséria.

Aliás, as relaçons Sul-Sul encontram-se em pleno desenvolvimento, com China desempenhando um papel destacado tanto como consumidor de matérias primas como quanto inversionista. A sua influência está crescendo rapidamente e superou a dos EUA em alguns estados ricos em recursos.

Mais significativas som as mudanças na areia de Oriente Próximo. Há 60 anos, o influinte planificador A. A. Berle aconselhou que controlar os incomparáveis recursos energéticos permitiria "um controlo substancial do mundo". Por sua vez, a perda do controlo ameaçaria o projecto de domínio global. Nos anos setenta os produtores importantes nacionalizaram as suas reservas de hidrocarburos, mas Ocidente retinha umha influência substancial. Em 1979, o Irám "perdeu-se" com o derrocamento da ditadura do Sha, que fora imposta por um golpe militar dos EUA e o Reino Unido em 1953 para garantir que este trofeu ficara nas maos ajeitadas. Agora, no entanto, o controlo está-se escapando até dos clientes tradicionais dos EUA.

As maiores reservas de crú encontram-se na Arábia Saudita, umha dependência norte-americana desde que os EUA desprazaram ao Reino Unido numha miniguerra librada durante a Segunda Guerra Mundial. Os EUA seguem sendo de longe o maior inversor na Arábia Saudita e o seu maior sócio comercial, e o país árabe apoia a economia norte-americana via inversons.

Nom obstante, mais da metade das exportaçons petroleiras sauditas dirigem-se agora a Ásia, e os seus planos de crescimento apontam a Oriente. O mesmo pode resultar certo com o Iraque, o estado com as segundas reservas mais importantes do mundo, se pode reconstruir-se após das assassinas sançons impostas polos EUA e o Reino Unido e da posterior invasom. E a política dos EUA está empurrando o Irám, o terceiro produtor mundial de petróleo, na mesma direcçom.

A China é hodierno o segundo maior importador de crú de Oriente Próximo e o maior exportador à regiom, reemprazando os EUA. As relaçons comerciais estám crescendo de maneira acelerada e duplicárom-se nos passados cinco anos.

As implicaçons para a orde mundial som significativas, com o é o ascenso da Organizaçom de Cooperaçom de Shanghái, que inclui boa parte de Ásia, mas que rejeitou aos EUA. Trata-se "potencialmente dum novo cártel energético que involucra a produtores e consumidores", comenta o economista Stephen King, autor de Perdendo control: as ameaças emergentes à prosperidade ocidental.

Entre os desenhadores de estratégias políticas e os comentaristas políticos ocidentais, 2010 é chamado "o ano de Irám". A ameaça iraniana considera-se o maior perigo para a orde mundial e enfoque prioritário da política exterior dos EUA, doutrina que a Europa segue cortesmente num pouco atrás, como de costume. Oficialmente reconhece-se que a ameaça nom é militar. Em realidade, a ameaça é de independência.

Para manter a "estabilidade", os EUA impuxérom severas sançons ao Irám, mas, fora da Europa, poucos estám emprestando-lhe atençom. Os estados nom alinhados - a maior parte do mundo- opugérom-se vigorosamente durante anos à política dos EUA para o Irám.

As achegadas Turquia e o Paquistám embarcárom-se na construçom de novos oleodutos para Irám, e o comércio vai em aumento. A opiniom pública árabe está tam anojada polas políticas ocidentais que a maioria até aprova o desenvolvemento iraniano dumha arma nuclear.

O conflito beneficia a China."Os inversores e comerciantes de China agora estám preenchendo um vazio no Irám a medida que os inversores de muitas outras naçons, particularmente da Europa, se retiram, informa Clayton Jones em The Christian Science Monitor. Em particular, China está expandindo o seu papel dominante nas indústrias energéticas iranianas.

Washintong reage a todo isto com um toque de desesperaçom. Em agosto, o Departamento de Estado advertiu de que "se a China quer fazer negócios por toda a parte, também terá que proteger a sua própria reputaçom, e se alguém adquire a reputaçom dum país disposto a evadir e esquivar as responsabilidades internacionais, isso terá um impacto a longo prazo... As suas responsabilidades internacionais som claras". Por outras palavras, que deve seguir as ordes de Washington.

É pouco provável que os líderes chineses se sintam impresionados por tais declaraçons, que constituem a linguagem dumha potência imperial tratando desesperadamente de amalhoar-se a umha autoridade de que já nom dispom. Umha ameaça muito maior do que o Irám para o seu domínio internacional é a China que recusa obedecer. E que, de facto, como potência maior, e em crescemento, desbota-as com desprezo.

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