26/01/2011

A reforma das aposentadorias é também violência de género

Elena Martínez López. Artigo tirado do Colectivo abertxale Boltxe  e traduzido para o galego por nós. A autora é militante de Izquierda Castellana.
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Apesar de todo o que se escreveu sobre a crise económica em marcha e a contrarreforma que se nos vem em cima, muito poucas reflexões se fizeram desde a perspectiva de género, isto é sobre suas repercussões específicas sobre as mulheres

É necessário reflexionar, desde uma mirada feminista, sobre nós, sobre como nos afecta em concreto essa reforma.

E uma vez mais, esta medida agrava o sistema de dominación patriarcal, aprofunda na violência sexista que todas as mulheres vivemos. Dá por sentado o "contrato sexual", essa exploração de sexo/género, um dos pilares nos que se baseia o sistema capitalista, e o reproduz.

Estamos num contexto de crise estrutural económica, política, social e institucional. Como parte dela, se estão a implantar um conjunto de medidas, que não são uma mera sucessão de recortes, de agudizar a precaridade, senão que supõem uma planificada mudança de modelo, uma diferenciación cualitativa em todos os aspectos da vida.

Esta mudança de modelo afecta ao económico (privatizações, reforma trabalhista, reforma da negociação colectiva...), mas também ao social e o político. E dentro disto, o papel e a concepção da mulher na sociedade, as conquistas conseguidas mediante a luta, é um dos âmbitos afectados. Podemos afirmar que há também um recrudecimiento do modelo patriarcal, mais uma nova volta de porca.

A evitável reforma das aposentadorias reforça o deterioro das condições de vida das mulheres. A reforma não é inevitável, não é verdadeiro que o sistema público de pensões não seja sustentável. O primeiro que teria que se propor é a seguinte questão, ao igual que para o conjunto de medidas tomadas até agora, estas reformas podem/querem solucionar a crise ou nos afundam de modo bem mais profundo nela? O único ao que nos conduzem é a impulsionar essa mudança de modelo.

As pensões, como o resto de privatizações e em general o recorte no gasto público social, tem como único objectivo abrir ao mercado capitalista, ao capital financeiro, todo o espectro das necessidades básicas, de elementos fundamentais para uma vida em dignidade.

Tanto o recorte do gasto público social como a reforma das pensões afectam em maior modo e de uma forma específica às mulheres. Vejamos por que.

2.

A afirmação geral dessa precarización da vida é necessária aplicá-la à realidade, a toda uma série de particularismos, que sempre temos de acrescentar a modo de lentes com os que olhar a realidade, e que são a classe social, a questão nacional e o género.

Assim por exemplo, tem-se uma mesma esperança e qualidade de vida independentemente da classe social à que se pertença? Afecta igual a falta de trabalho a um trabalhador de Madrid que a um castelhano de outra cidade ou povo que está avocado à emigración? Por que e sobre quem se exercem as redadas racistas? Têm a mesma relação com o mercado trabalhista as mulheres que os varões?

3.
Mas o grande elemento facilitador das violências de género hoje em dia é a negación de sua existência como prática normalizada e o reconhecimento social só de suas facetas mais descaradas e sangrentas (a redução das  violências de gero à violência domestica, sua excepcionalización)

A violência de género é inherente a nossa organização social.
"Para a desarticulación das violências de género faz-se fundamental deslocar nossa crítica desde a violência em si para a estructuración generizada, jerárquica e discriminatoria da sociedade em que vivemos"

Estado de Wonderbra, Barbara Biglia e Conchi San Martín

Entendemos assim por violência de género essa violência quotidiana, constante e aplicada sobre o conjunto de mulheres pelo facto de ser mulheres. Entendemos por violência de género o sistema de dominación patriarcal que é base e justificativa de todas as expressões de violência de género, reforçadas pela opresión capitalista e nacional.

Desde essa base de violência estrutural, a reforma das pensões exacerba a desigualdade, é violência de género:

-       Porque não parte da desigual realidade.

Não integra uma análise feminista que assinale a existência de papéis sexistas, óbvia que há um desigual partilha e jerarquización do mundo productivo e o reproductivo, e não atende às diferenças entre homens e mulheres dentro do mundo productivo.

Parte da assentada concepção patriarcal do mundo e do trabalho, entendendo a este exclusivamente como uma de suas formas: o emprego, e deixando fosse todo outra série de trabalhos, como são os cuidados.

-       Porque é assim uma lei de e para o "homem branco rico".

É uma legislação androcéntrica, que toma ao varão como modelo universal e reforça a ficção de igualdade, fazendo achar que é indistinto falar de homens e mulheres, ocultando que umas e outros não  vivemos uma idêntica realidade.

Os particularismos são necessários, é indispensável falar das condições de vida das mulheres, e dentro destas teria que assinalar as diferenças entre as da classe dominante, as jovens, as imigrantes, as que vivem em lares gracioso-marentales ou as maiores e as do mundo rural, com um peso importante em Castilla.

-Porque  temos que recordar as características de desigualdade da mulher em relação ao trabalho, o ocultar, como o faz a reforma, é se fazer cúmplice da situação:

1.      Precaridade

2.      Menos trabalhadoras assalariadas que varões

3.      Mais temporalidad

4.      Discriminação salarial

5.      Mais trabalho informal

6.      Recae sobre nós o trabalho doméstico não remunerado

7.      Generizaç
ão do mercado trabalhista, existência de empregos-sectores feminizados (como a limpeza, a atenção de pessoas maiores?)

Menor salário, mais temporalidade,  permissões, excedências, por maternidade ou outros cuidados, inserção mais tardia ao mercado trabalhista num rango de idade de mulheres, trabalhos submergidos... afectam de modo directo ao tempo de cotação, a uma menor quantia da pensão.

Actualmente os homens aposentados ganham quase o duplo que as mulheres, diferença que se explica por essa desigualdade sexista na vida (incluído o mercado de trabalho). A pensão contributiva média do homem é de 959 euros, em frente aos 565 da mulher.

- Menção específica requer também outro dos aspectos da reforma e é o ponto da eliminação ou merma das pensões de viudedade, que de novo, tem um componente de género finque.

Este componente finque acha-se nos dados objectivos, as cifras de mulheres que cobram uma pensão de viudedad (e não todas as viúvas cobram pensão) é em torno do triplo que o numero de varões que a percebem. Isto está também condicionado pela maior esperança de vida das mulheres.

Outro dado a ter conta é que dentro desse grupo menor de viúvos, muitos deles terão também  um salário ou uma pensão contributiva além da de viudedade. No entanto, nem a metade das mulheres que actualmente percebem uma pensão de viudedade, recebem também uma pensão contributiva ou um salário aparte.

E isto não é anecdótico, já que actualmente tanto as pensões não contributivas como a maioria das de viudedade estão já  -sem que tenha entrado a reforma- por embaixo da linha da pobreza, são muito inferiores ao precário salário mínimo interprofesional, estamos a falar de que algumas giram em torno de quase 400 euros, outras pouco mais de 500 euros. Isto é, estamos a falar de uma das caras disso que se chama feminización da pobreza.

Mas, aparte destes dados, há outro que se relaciona com uma violência de género prévia, estrutural. No caso das mulheres, a pensão média de viudedad é praticamente igual à pensão média de aposentação contributiva.

Isto é, após realizar as contas, podemos achar que -para muitas mulheres casadas as cotações de toda uma vida podem não valer bem mais que sua condição de esposas; e em muitos casos valem menos. Assim, algumas mulheres (sobretudo nos trechos de baixos salários) vêem-se incentivadas a permanecer na economia submergida ou no lar, confiando seu futuro às cotações de seu marido... e isto segundo um relatório do Instituto de Estudos Fiscais, órgão dependente do Ministério de Economia, que nos adverte que a reforma nas pensões vai ampliar a brecha de género que já existe no sistema.

Que concepção de mulher subjaz a tudo isto?

Premeia-se a permanência das mulheres no lar. Mas, pode-se viver actualmente seguindo o modelo tradicional de família, com só o varão trabalhando asalariadamente?

Está a empurrar-se às mulheres à economia submergida? Não nos situa isto numa situação de precariedade brutal? Não nos situa numa relação de dependência que em nada ajuda a superar as situações de maltrato sexista, seja físico ou/e psicológico? Não colabora a empequenecer nossa autoestima e minar nossa independência?

Alguns defendem, que precisamente tirar as pensões de viudedade animaria às mulheres a trabalhar asalariadamente. Poderia pensar-se então, que actualmente há paradas por gosto. E o tema central fica desviado da atenção, retirar as pensões de viudedad e o conjunto da reforma das pensões: melhora em algo as precárias condições trabalhistas das mulheres, incrementa a quantia média da pensão a receber? Tem-se em conta todo um trabalho que as mulheres muito animadamente desempenhamos, o de cuidados?

- (E é também violência de género) Porque a reforma das aposentadorias uma parte mais da mudança de modelo, e é por tanto necessário o conectar com outras das medidas tomadas, em especial as privatizações -de educação, previdência, equipamentos municipais como polideportivos- e do recorte em general de gasto público social, como o tijeretazo à lei de dependência, que nunca chegou a arrancar.

Tudo isto recrudece o papel sexista que se tem atribuído sobre as mulheres, já que sobre elas recae todo o que respecta a cuidados (filh@s, pessoas dependentes). Sobrecargando assim às mulheres -física e mentalmente- com todo um trabalho, que ademais não vai ser reconhecido.

Por um lado, isto invisibiliza-se, por outro  faz-se que sejam as mulheres as que o desempenhem, não se tem em conta para as pensões, nem como afecta indirectamente sobre elas, ou é que vão fazer uma reforma sobre a quantidade de horas que tenham nos dias das mulheres?

Para poder cobrar uma pensão a partir de agora precisaremos mais anos cotados, mas se  sobre a mulheres vão continuar recaendo e de um modo maior todo o trabalho de cuidados, como evitar-se-á a tomada de permissões/licenças, os trabalhos eventuais ou a tempo parcial que definem o emprego da mulher? Não está o sistema potenciando um comportamento e ao mesmo tempo depois castiga-o?

E ademais, com a reforma trabalhista não se potenciou o trabalho a tempo parcial, "flexível", sem horários determinados?, não decidiu também o governo "por motivos orçamentas" o recorte sobre a permissão de paternidade que ajudaria à partilha do trabalho de cuidados?

Um argumento com o que pretendem justificar a reforma das pensões é a taxa de envelhecimento. Isto implica também uma maior taxa de dependentes, de pessoas precisadas de cuidados. Que contribui a reforma das pensões a esta questão que nos apresentam como sua razão de ser?

Se uma saída seria rejuvenecer a taxa de população, em que ajuda o que as mulheres tenhamos a pressão de ter que trabalhar asalariadamente mais, ao mesmo tempo em que teremos que fazer frente a mais trabalho reproductivo? Por não nomear o nível de endevidamiento das famílias, as privatizações, o imparável aumento de luz, gás, etc., junto com o problema do desemprego, questões que também não ajudam nada a estimular a natalidade.

-Há uma consequência além de tudo isto, que vale a pena ser proposta, por permitir a reprodução de todo este sistema de dominación patriarcal e sua ideologia.

Se as mulheres vamos ter que desempenhar maiores níveis de trabalho, tanto no reprodutivo, como no produtivo, que tempo e saúde vital nos vai ficar para autoorganizar-nos e mudar essa situação?

4.


Parece que vamos ter que trabalhar mais e cobrar menos, se chegamos a cobrar algo.

Que se pretende verdadeiramente com todas estas reformas? Sair da crise é óbvio que não, reforçar a violência sobre mulheres, povos e trabalhadores para garantir os benefícios para uns poucos parece ser mais bem seu objectivo.

A ofensiva patriarcal contra as mulheres vem de muito atrás, com a crise esta adquire novos matizes e potências, e dá a mão à concepção de mulher como objecto, seu sexualidad como mercadoria para a compra e venda, as agressões dos grupos anti-eleição sobre o direito ao aborto, os assassinatos sexistas, etc.

E ante isto, que fazer?

A necessidade da presença das mulheres na luta, tanto em organizações próprias como nas organizações políticas, sociais, sindicais... é uma tarefa imprescindível. Inserir o discurso feminista em toda prática transformadora é fulcral. Como bem resume a frase: a revolução será (também) feminista ou não será. As mulheres temos que desempenhar um papel em toda esta luta contra a reforma das pensões, contra a mudança de modelo e por uma saída política à crise, temos muito que contribuir na construção dos movimentos populares.

¡Não à reforma das pensões! ¡Vamos às mobilizações contra ela!

¡Que viva a luta das mulheres!

¡A crise que a paguem os capitalistas!

¡Adiante o movimento popular castelhano! ¡Adiante comuner@s do sXXI !

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