Flávio Aguilar. Artigo tirado de Carta Maior (aqui).
Um semi-escândalo escandalizou a Alemanha na última semana. Semi-escândalo? Sim, porque tem gente para quem isso é normal. Descobriu-se que o Serviço de Inteligência Alemão, digamos, o nosso antigo SNI daqui, chamado de “Agência de Proteção à Constituição”, espionava sistematicamente um número muito alto de deputados e políticos do Partido Die Linke – A Esquerda.
Na sua lista de espionagem estavam 27 de 76 deputados no Bundestag, o Parlamento Federal, mais 11 outros políticos de cúpula do partido. Entre aqueles, um dos principais líderes do Die Linke, Gregor Gisi.
Na sua lista de espionagem estavam 27 de 76 deputados no Bundestag, o Parlamento Federal, mais 11 outros políticos de cúpula do partido. Entre aqueles, um dos principais líderes do Die Linke, Gregor Gisi.
Gisi é um político que veio da antiga Alemanha Oriental. Era um advogado de direitos humanos por lá e naquele tempo. Mas acusam-no de ter feito parte (ou ser informante) da Stasi, a antiga polícia política da Alemanha comunista. Na sua posição de ser defensor dos direitos humanos na RDA, é claro que Gisi – que é um político extremamente simpático e progressista – deve ter tido contatos com a Stasi. E é claro que deve ter muitos inimigos deste lado do inexistente, mas resistente muro para detratá-lo.
Num caso mais grave do que de Gisi, a polícia secreta alemã tem, entre seus investigados/espionados, o deputado do Bundestag Steffen Bockhahn, que soe ser membro da Comissão Parlamentar encarregada de vigiar os serviços alemães de inteligência, inclusive do seu orçamento.
Houve comparações elucidativas: essa “Agência de Proteção à Constituição” conta com 7 agentes e um orçamento de 400 mil euros anuais para investigar Die Linke. Tem apenas 10 agentes e 590 mil euros anuais para investigar a miríade de partidos e movimentos de extrema-direita, inclusive o considerado neo-nazi NPD.
A diferença ganhou relevo depois que descobriu-se a “célula [neo-nazi] de Zwickau”, um grupo de extrema direita que cometeu assassinatos e atentados contra imigrantes sem ser minimamente molestado pelos serviços de investigação durante mais de dez anos, apesar de todas as evidências apontarem para eles ou algo no gênero.
O caldo (ou o enredo) engrossou mais ainda depois que um político da CDU (da chanceler Ângela Merkel), num programa de TV no domingo passado, defendeu que a polícia secreta investigasse especificamente Die Linke, e disse que era favorável a que se proibisse o partido.
Dificilmente esse tipo de proposta vai prosperar. Mas mostra o clima reinante em boa parte do mundo político alemão, rançosamente anti-esquerdista, pró-Ocidente, neo-liberal.
Políticos do Partido Verde (entre eles Valter Becker, porta-voz oficial do partido) manifestaram preocupação e repúdio diante da denúncia. Não vi ainda (pode ter sido falha minha, e passei a última semana em parte fora) atitude semelhante por parte do SPD.
Da direita nada se espera.
Nenhum comentário:
Postar um comentário