O líder da Frente de Esquerda, Jean-Luc Mélenchon,
afirma que o presidente francês atravessou um limite simbólico com a sua
proposta de “pacto de responsabilidade”, destinado a baixar os custos
do trabalho. Cortes de gastos de Hollande são o triplo dos de Sarkozy.
François
Hollande atravessou também um limite simbólico, pondo ponto final à dita
“especificidade” do Partido Socialista dentro da social-democracia
mundial e europeia. Foto de Jean-Marc Ayrault
A conferência de imprensa do passado dia 14 em que François Hollande
detalhou a sua proposta de “pacto de responsabilidade”, destinado a
reduzir os custos do trabalho, é, na opinião de François Mélenchon, “a
viragem à direita mais violenta de um governo suposto de esquerda, desde
Guy Molet, eleito para fazer a paz na Argélia, e que mandou para lá um
contingente de guerra”. Escrevendo no seu blog,
o líder da Frente de Esquerda sublinhou que Hollande foi eleito para
virar a página de Sarkozy e fazer guerra à grande finança. Só que
“disso, já não sobra nada”, afirma.
Perguntado por um jornalista que diferença há entre a sua política e a
de Sarkozy, Hollande respondeu que a diferença é que Hollande faz o que
Sarkozy foi incapaz de fazer em matéria de política económica de
direita. “Ele orgulha-se de ser pior que Nicolas Sarkozy”, exclama
Mélenchon, observando que pelos números, isso é pura verdade. “Fillon
cortou 15 mil milhões de gastos públicos. Hollande triplicou o corte.”
Quanto à “guerra à finança”, sublinha Mélenchon, a política de Hollande
é a caricatura do que dizia Charles Pasqua, segundo o qual “promessas
só comprometem quem acredite nelas”. Diz o dirigente da Frente de
Esquerda: “Não é surpresa para nós, militantes políticos, cidadãos
esclarecidos. No fundo, sempre soubemos no que acreditar”.
Há, na visão de Mélenchon, um salto qualitativo na política de
Hollande: o novo pacto económico dá mais 15 mil milhões ao patronato do
MEDEF (Mouvement des Entreprises de France / Movimento das Empresas
Francesas, a maior central patronal francesa). No total, os dois últimos
planos de Hollande injetaram 35 mil milhões de dinheiro novo no MEDEF,
arrancados integralmente do consumo da população.
Atravessado um limite simbólico
Para Mélenchon, ao assumir publicamente a sua viragem neoliberal,
François Hollande atravessou também um limite simbólico, pondo ponto
final à dita “especificidade” do Partido Socialista dentro da
social-democracia mundial e europeia.
O líder da Frente de Esquerda adverte que ao dar um voto de confiança
ao “pacto de solidariedade” que Hollande propôs aos empresários
franceses, a chamada esquerda do Partido Socialista e os Verdes
“validarão a brutal fórmula produtivista e antissocial que resume tudo,
no plano da filosofia política: 'a oferta cria a procura'. Hollande vai
fazer o Parlamento engolir mais e mais prendas ao patronato...”
Por isso Mélenchon é claro: “Não queremos ser envolvidos em nenhuma
aliança com o Partido Socialista. Não seremos envolvidos”. Trata-se, na
sua opinião, de um debate estratégico de fundo. “A independência
política da Frente de Esquerda em relação ao Partido Socialista é para
nós uma questão fundacional, que ultrapassa em muito as tolices sobre
'unificar a esquerda' e outros disparates semelhantes que os socialistas
franceses usam como boia salva-vidas”.
Setores do PCF a favor de votar o pacto de Hollande
Mélenchon dirige-se então a “alguns setores” do Partido Comunista
Francês (PCF): “assumam a vossa orientação, e aprovem o pacto, se
acharem útil, com os socialistas, e desde o primeiro turno. É vosso
direito. Tem de ser respeitado como tal”. Mas a adverte: “Não tentem
envolver outras forças que se integram no nosso movimento nas vossas
escolhas. Também temos direitos, que também têm de ser respeitados”.
A opção de Mélenchon é trabalhar, como sigla sem compromisso com o PS,
para formar uma oposição de esquerda. “Votar contra, na votação do pacto
de responsabilidade pode ser o ponto de partida. Essa oposição de
esquerda não se pode resumir à Frente de Esquerda. Tampouco pode ser
efeito de encontros e de 'convergências' com setores mais bem nutridos
do PS, cuja audácia política só vai até a guerra mediática inócua, sem
consequências práticas”.
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