13/05/2010

Avions e volcans

Joaquim Sempre, tirado e traduzido desde aqui.

Trás a prolongada paralizaçom do tráfico aéreo europeu provocada pola eruçom do volcám islandês e as correspondentes perdas, algumhas companhoas empeçárom a reclamar ajudas económicas dos estados para superar a fochanca. Mais umha vez, escuitamos umha surpreendente interpretaçom da economia de mercado que consiste em dizer que o Estado deve abster-se de intervir na economia, e deixar que a empresa privada cubra toda a demanda e faga o seu legítimo negócio. Isso si: quando as cousas forem mal e surgir um imprevisto, o Estado deve mesmo intervir para salvar a empresa.

Segundo a ortodoxia doutrinária, o mercado é um bom regulador porque premia ao empresário eficaz e castiga com o fracasso ao que nom o é. Em caso de imprevistos, existem companhias de seguros que cobrem as eventualidades, também segundo as regras de mercado. Porém, à hora da verdade, esta ortodoxia deixa-se arrumbada no faiado e acode-se sem complexos a papá Estado para que salve as companhias ameaçadas de queda.

Para ajuiciar essa reclamaçom de ajudas, vale a pena examinar mais de perto alguns aspetos da aviaçom comercial. Para empezar, as aeronaves consomem um combustível que está isento de impostos. Quando preenchemos o depósito do carro com gasolina, pagamos 396 euros por mil litros de carburante (na Itália, pagam-se 564; na França, 606, e na Alemanha, 655). No Estado espanhol, os impostos som quase a metade do preço; nos outros países, mais da metade. Em troca, o carburante da aviaçom nom paga nem cinco. No Congresso dos Deputados houvo duas proposiçons de lei para eliminar a exençom de impostos do combustível da aviaçom (siguindo os exemplos de Noruega e da Holanda), umha apresentada por ERC em Setembro de 2007 e outra apresentada por IU-ICV, WWF Espanha, Greenpeace, Ecologistas em
Açom e Comissons Obreiras em Julho de 2009. Nengumha das duas prosperou e o gasóleo para a aviaçom segue a estar isento de toda carga impositiva. E nem só isto, mas ademais a aviaçom fica fora do Protocolo de Kyoto em matéria de quotas de emissons de CO².

Porém o problema está sobre a mesa: em Dezembro de 2007, adotou-se umha proposta de diretiva europeia na matéria. Proposta decepcionante: debateu-se se deviam adotar-se gravames ou direitos de emissom, e resolveu-se descartar os gravames. Em princípio, hai o compromisso de que a partir de 2012 os voos comerciais da Uniom Europeia deverám regir-se polos direitos de emissom estabelecidos polo Protocolo de Kyoto. Calculou-se que, se se adota este compromisso, as aerolinhas da UE deverám desembolsar em conjunto uns 4.000 milhons de euros anuais por estes direitos de emissom, o qual repercutirá em aumentos dos preços dos voos que pagarám os usuarios.

Estes dados ponhem em evidência umha paradoxa: por quê é que se dam benefícios fiscais a um luxo, o luxo de voar? Trata-se dun luxo ambientalmente muito caro. A aviaçom é o modo de transporte mais custoso em energia consumida por pessoa-quilómetro: em 2005, consumia 12% de todo o petróleo usado no transporte mundial, o qual é umha proporçom enorme se se tem em conta que o transporte inclui navegaçom, comboios e veículos de motor. O baixo custe dos voos tem estimulado o uso trivializado e abusivo do aviom. O velho sonho de Ícaro converteu-se nalgo tam banal para a quinta parte privilegiada da humanidade que qualquer recorte ou encarecimento viverá-se como umha perda.

A pesar disso, nom podemos ignorar que, de facto, é mesmo um lujo. Destarte, ao ser um modo de viajar con uns riscos mui controlados, mas nom por isto menos importantes, exige umhas precauçons especialíssimas. Por isso, perante um acidente natural como o dos efeitos da erupçom volcánica, nom fai sentido que o erário público saia a cobrir as perdas empresariais. Economicamente, os riscos cobrem-se com pólizas de seguros. O normal é que as companhias tomem esses seguros e que os viajantes paguem o custo que lhes corresponda das pólizas.

Acaso devemos aceitar que se encareça viajar em aviom? Pois so, isto é exatamente o que proponho. De facto, significa propor que se pague todo o custe real de viajar em aviom: hai que incluir no custe do voo a puluiçom atmosférica, o aquecimento global e uns seguros que cubram um modo de viajar arriscado. Em realidade, se pagaramos todos os custes implicados na aviaçom (incluindo, por exemplo, a construçom e mantemento de aeroportos), a fatura seguramente ainda seria superior. E é que só se nos acostumamos a pagar todos os custes das nossas atividades correspondentes ao deterioro do meio natural, apreenderemos a respeitá-lo e a administrar sabiamente os recursos naturais que hoje estamos dilapidando. Viajaremos menos en aviom, mas nom creio que isto empobreça as nossas vidas. O gravíssimo problema que teremos é que nos afixemos a estas comodidades e custará-nos prescindir delas.

Em menos de 20 anos, entre 1990 e 2007, a quantidade de voos no mundo duplicou-se. Nom podemos continuar assi. A Terra pom-nos limites: escuitémo-la. E, em todo caso, nom fagamos a asneira de subsidiar luxos: reservemos os recursos do Estado –que som os de todos– para cobrir necessidades básicas nom satisfeitas.
Joaquim Sempere é professor de Teoria Sociológica e Sociología Medioambiental da Universidade de Barcelona

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