11/10/2010

O governador do Banco de Espanha, contra o Estado

Juan Torres López. Artigo tirado de aqui. O autor é catedrático de Economia Aplicada na Universidade de Sevilha. A traduçom para galego-português é de nosso




Noutras ocasions comentei já nesta coluna que as posiçons do governador do Banco de Espanha nascem dumha visom ideológica das relaçons económicas que nom se corresponde com a realidade.


A melhor prova disto som os seus continuados erros de análise e prediçom, facilmente comprováveis se a posteriori se cotrastam as suas declaraçons públicas com o que efectivamente sucedeu, ou as análises que fixo o banco com a evoluçom real da economia.

Assim, a pesar de dispor de todos os meios a sua disposiçom, o Banco de Espanha e o seu governador (como os de outros estados) fôrom incapazes de prever a crise financeira nem sequer quando estava a duas quartas dos seus narizes. De nom ser pola gravidade da situaçom, faria troça que quem demonstrou tantas vezes a sua falha de acerto e perspicácia na análise da realidade se apresente agora à cidadania como o que tem as chaves para sairmos da crise.
E a pesar de desfrutar de todas as competências políticas necessárias, o Banco de Espanha foi incapaz de cumprir com o principal alvo que se lhe encomenda, evitar a subida de preços, e permitiu que os da vivenda alcancem os níveis mais altos da história.

O governador mantém também desde há tempo, como os seus colegas do Banco Central Europeu, umha posiçom sobre a política fiscal baseiada numha mera conviçom ideológica sobre o papel do gasto público e dos impostos que está freando em toda a Europa a possibilidade de criar actividade económica suficiente, de alcançar o emprego complesto e de proporcionar à sua cidadania bem-estar e progresso, com o galho simplesmente, de salvaguardar os interesses das grandes empresas que dominam o mercado.

Como dizem também noutras ocasions, o governador mente aliás quando analisa o que está acontecendo na economia espanhola.

Se fora a primeira vez que o di poderia qualificar-se como um erro de análise, mas afirmar de forma já reiterada que o "vertiginoso aumento del número de parados" é devido a "las disfuncionalidades en el funcionamiento de nuestro mercado laboral" é simplesmente umha mentira. Porque o que fixo e fai que tenhamos taxas de desemprego tam elevadas nom som apenas nem as normas ou instituiçons labrais que regulam o nosso mercado laboral, mas também a falha de suficiente suporte produtivo e a excessiva especializaçom da nossa economia na construçom que quiçais seja a actividade económica mais proclive a utilizar a mao de obra ao som dos vaivéns do ciclo. E o governador sabe perfeitamente que por muitas reformas laborais que se desenvolvam na linha que ele propom nom se resolveria o problema do paro se a nossa economia segue baseando-se na especulaóm com o tijolo, sem dispor de mais capital social e, sobretodo, dumha maior componente de inovaçom e capacidade para gerar valor engadido.

Porém se todo isto é grave, as declaraçons que fixo o governador na sua comparecência perante o Congresso dos Deputados o passado dia 5 traspassam já um novo e incrível Rubicom.

Nom entrarei agora nalgumhas das suas manifestaçons mais concretas e completamente infundadas, como que abrir as caixas de poupança ao capital privado lhes permitiria afrontar o futuro "sin necesidad de solicitar ayuda de los contribuyentes", quando a realidade é que no Reino da Espanha e por toda a parte quem mais ajuda recebeu do Estado, agora e antes, foi precisamente a banca privada. Refirirei-me a outras três que considero muito mais graves e que, em minha opiniom, merecem umha censura social e política imediata e e contundente em defesa da nossa democracia.

Em primeiro lugar, refirirei-me ao facto de que Fernández Ordóñez dê ordes ao governo ao assinalar-lhe imperativametne que "debe cumplir el objetivo de reducir el déficit hasta el 6% sobre el PIB en 2011", o que significa nem mais nem menos que o governador de Espanha exerce a funçom que desde que se acabárom as monarquias absolutistas corresponde ao poder legislativo como expressom directa da vontade popular.

Diria-se que essa posiçom do governador é a expressom da sua independência e assim o é efectivamente. Porém aí radica o problema porque dessa forma manifesta-se claramente que a existência dumha autoridade ou instituiçom independente do Estado é materialmente incompatível com o seu carácter democrático. Na medida em que priva os poderes representativos de capacidade material de decidir autonomamente no ámbito das suas competências constitucionais (como é elaborar livremente um orçamento em que se fixam os ingresos e os gastos que se consideram mais convenientes para os interesses da naçom) um banco central independente actua como um verdadeiro corsé, como umha limitaçom material da democracia.

Como dizia o grande constitucionalista do nosso Tribunal Constitucional Manuel García-Pelayo "es ingenuo suponer que en la mayoría de los casos el instrumentario técnico esté en condiciones de proporcionar la única, mejor y, por tanto, indiscutida vía posible. Lo cierto es que las políticas económicas favorecen a unos intereses y lesionan a otros y que (…) en la mayoría de los casos, los costos de las soluciones dadas se reparten desigualmente entre los distintos grupos o estratos de la población" (Las transformaciones del Estado contemporáneo. Alianza, Madrid, 1990, pág. 74).

Outra cousa é que deva gozar de autonomia para desenvolver a política monetária que responda a uns objectivos gerais de política econ´mica que devem ser definidos com os poderes representativos e que, em todo caso, deve aplicar-se coordinadamente com o fiscal, nunca como umha restriçom desta última.

Em segundo lugar, refiro-me às declaraçons do governador no debate com os parlamentários, quando afirmou que "las comunidades son soberanas hasta cierto punto si nos fastidian a todos". Umha auténtica barbaridade que nom pom apenas em questom o nosso ordenamento constitucional, mas que também responde a esse novo tipo de pensamento totalitário que permite a quem o sustenta considerar-se a si próprio como exclussivo intérprete e depositário de "todos" os interesses sociais.

É umha aberraçom insensata considerarmos que as comunidades autónomas som alheias ao "todos", como se os seus governos nom foram a expressom democrática da vontade popular e parte do todo e cujo poder soberano (que nom é nem pode ser outro que o que lhes dá a Constituiçom) nom poda ficar afora do que afirme umha autoridade independente que se sinte intérprete inequívoco do que beneficia ou "fastidia a todos" os demais.
É evidente que a política fiscal das comunidades autónomas deve desenar-se no marco de todo o Estado, mas nom em termos duha cesom de soberania, mas do seu exercício compartilhado e, muito menos, em virtude do critério que estabeleça unilateralmente um poder que nom esteja nem pode estar concebido para impor-se aos demais.
Finalmente, refiro-me também à posiçom que adota o governador perante os ataques que sofre a economia espanhola, que formam parte do que no seu dia qualificou o presidente da Junta de Andaluzia como "terrorismo financiero".

Caberia cavilar, à vista está que ingenuamente, que quando um Estado democrático se vê ameaçado nas suas autoridades [no seu Imperium; N.T.], e mais especificamente o governador do seu banco central dada a natureza desses ataques, deveria pôr-se ao seu carom, e como um servidor fiel defendê-lo dos perigos que o coutam.
No entanto, no lugar de censurar os que especulam e constantemente difundem até falsidades sobre a economia espanhola, o governador aviva as lapas que acendem pondo em dúvida os dados do governo e chama a complacê-los e a aceitar a sua chantagem para ganhar umha credibilidade que, à vista está, nunca garante que os mercados actuem dum modo menos depredador face à nossa economia.

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