25/08/2011

É possível compreender o caos?

Theotônio dos Santos. Artigo tirado de aqui. O artigo original pode ler-se no Blog de Theotonio dos Santos.

A desproporcional intervenção fiscal do governo estadunidense para salvar o sistema financeiro atual é similar à intervenção do Japão no começo da década de 1990 para salvar os absolutamente inúteis bancos japoneses. Ela é pior ainda porque os Estados Unidos, além de transferir recursos colossais para o sistema financeiro quase tão inútil como o japonês, tem gastos insustentáveis como as guerras sucessivas e como as "prevenções" de guerras megalomaníacas que pretendem submeter todo o planeta ao seu domínio. O artigo é de Theotonio dos Santos.


Venho discutindo com Immanuel (Wallerstein) e um grupo de colegas há muitos anos sobre esta situação que prevíamos, baseados não somente nos ciclos longos de Kondratiev. Temos contudo que ter claro alguns pontos que ainda resultam polêmicos, mesmo dentro do nosso grupo de estudiosos do sistema mundial. É necessário destacar duas coisas.

Primeiro, não estamos numa fase desfavorável do ciclo longo, estamos no meio de um período de crescimento. Isto explica que apesar das dimensões colossais da crise da especulação financeira internacional, continua havendo crescimento da economia mundial. Este ciclo positivo deverá esgotar-se em aproximadamente 10 anos quando deveremos substituir o atual padrão tecnológico mundial por um novo paradigma cuja introdução exigirá uma destruição massiva de grande parte da estrutura econômica mundial e das várias estruturas nacionais. Neste momento, a crise atual parecerá uma brincadeira e a idéia de caos que maneja Immanuel se aproximará bastante da realidade deste novo período.

Segundo, a desproporcional intervenção fiscal do governo estadunidense para salvar o sistema financeiro atual é similar à intervenção do Japão no começo da década de 1990 para salvar os absolutamente inúteis bancos japoneses. Ela é pior ainda porque os Estados Unidos, além de transferir recursos colossais para o sistema financeiro quase tão inútil como o japonês, tem gastos insustentáveis como as guerras sucessivas e como as "prevenções" de guerras megalomaníacas que pretendem submeter todo o planeta ao seu domínio.

Logo, os Estados Unidos não podem mais situar-se como o grande "puxador da economia mundial", como vem ocorrendo já nos últimos 10 anos. Deverá ter um crescimento medíocre junto com a Europa. Apesar de que esta poderia ter melhor situação se assumisse seu destino euro-asiático e abrisse suas economias,sociedades e cultura para uma audaz aproximação com a Rússia, a China e a Índia. E ao mesmo tempo, apoiasse o sul da Europa para ligar-se fortemente com a Turquia, com todo o Oriente Médio, a África e a América Latina. Abaixo o Atlantismo que destrói a Europa!

Quanto aos chineses, não têm outro caminho que usar seus dólares e mesmo seus títulos da dívida norteamericana para adquirir empresas em toda a economia ocidental utilizando os fundos soberanos que já têm e os novos que pensam criar. Seu destino é converter-se na principal força econômica ( e financeira) do capitalismo mundial.

Valha capacidade de teoria econômica não ortodoxa para compreender estas realidades e atuar sobre elas. Feliz ou infelizmente o capitalismo de estado da China e de grande parte do chamado Terceiro Mundo deverão dirigir a economia mundial a partir de um período muito curto. Estamos em plena transição para esta nova fase.

Lutemos para que esse capitalismo de Estado esteja submetido a forças democráticas (isto é, as maiorias sociais e não as "elites" antidemocráticas ocidentais, apesar de seus discursos liberais).

Lutemos para encontrar regimes políticos que permitam este diálogo constante entre os Estados e os povos. As formas de representação eleitoral usadas no Ocidente estão em plena degradação com um descontentamento de massas colossal, pois os grandes movimentos de massa do momento não são as rebeliões árabes e sim a ocupação das ruas européias pelos grandes protestos populares.

Não estranhem o fato de que as notícias monitoradas pela grande imprensa internacional não lhes deixem visualizar esta imagem. Há toda uma nova agenda a ser desenvolvida nesta nova situação histórica. A América Latina está fazendo um esforço muito positivo nesta direção. Ela inclui uma drástica reforma dos meios de comunicação e uma maior comunicação Sul/Sul. Temos que pensar com energia, audácia e criatividade. Inmanuel Wallerstein é um dos poucos que está nesta trincheira.

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