13/09/2011

A China se beneficiou do 11-S?

Júlio Rios. Artigo tirado de Diário Liberdade (aqui) e publicado originalmente em castelhano em Rebelión.

A resposta só pode ser afirmativa, mas não se deve exagerar. A guerra contra o terrorismo debilitou o papel dos Estados Unidos no mundo, ao mesmo tempo que a ressurreição da China, passando da sexta posição no ranking econômico mundial (2001) à segunda (desde 2010), seguiu em ascensão. Em 2001, o PIB dos EUA foi de 10.14 trilhões de dólares e em 2010 ascendeu para 14.51 trilhões, em contraste com os 1.18 trilhões e os 5.88 trilhões da China em ambos anos.


Washington segue imerso nas custosas guerras do Afeganistão (desde outubro de 2001) e do Iraque (desde março de 2003), ambas desatadas no marco da guerra global contra o terrorismo anunciada pelo ex-presidente Bush no momento seguinte ao 11-S. Tais guerras, não obstante, com vitórias duvidosas, permitiram aos EUA satisfazer também objetivos estratégicos importantes (a guerra do Iraque nada teve a ver com o 11-S por mais que esse fosse um dos principais argumentos oficiais para conseguir a aceitação da população estadunidense), reafirmando sua hegemonia global, que segue sendo indiscutível no plano militar, por mais que tenha minguado na ordem econômica. O enorme gasto em defesa (segundo o SIPRI o dos EUA em 2009 foi seis vezes maior que o da China) contribuiu para aumentar o déficit orçamentário e a dívida nacional, e não conseguiu mitigar novos desafios como o próprio ressurgimento do Irã como ator regional de peso.

No plano político-ideológico, os excessos que acompanharam a cruzada contra o terrorismo, com sua sequela de gravíssimas violações dos direitos humanos, não acabam de se dissipar, inclusive aós o relevo democrata na Casa Branca. O Presidente Obama, com uma linguagem bem diferente de seu antecessor, desencantou muitos por sua inconsequência em ações como o fechamento da prisão de Guantánamo, mas ele não derivou em um maior atrativo para a China, por mais que afirme impulsionar uma nova ordem política e econômica internacional de perfil incerto e em qualquer caso não antagônico com as tendências globalizadoras promovidas por Washington.

Na China, o corrido nos EUA serviu para chamar a atenção internacional sobre a gravidade do desafio que encara em Xinjiang, região autônoma onde a nacionalidade uigur multiplicou de modo constante suas ações violentas para contestar a política de Pequim, que relaciona o secessionismo uigur com a rede al-Qaeda. Mas se diria que não encontrou complacência especial, aumentando as críticas a sua política em matéria de direitos humanos, alertando sobre a extensão do qualificativo "terrorista" a simples manifestações de dissidência.

Em um contexto mais geral, o 11-S acelerou o processo em virtude do qual se abre passo a um cenário de coexistência global de diferentes centros de poder econômico. Essa evolução era previsível de modo igual, se bem que poderia se dar em um ritmo diferente. Por outro lado, provavelmente a crise financeira iniciada em 2008 assegure um protagonismo de maior alcance ao dedutível do 11-S. Os investimentos diretos chineses no exterior subiram em 2010 para 68 bilhões de dólares, superando pela primeira vez o Japão e o Reino Unido.

Dez anos depois, a China apresenta um perfil mais incisivo em sua política exterior e, muito especialmente, multiplicou sua presença e influência no sudeste asiático e no entorno regional imediato, eclipsando tanto a presença do Japão como dos EUA, ambos em uma retirada dificilmente evitável pese as promessas de Hillary Clinton de "voltar" à região se servindo para isso das tensões no mar da China meridional. Neste sentido, pode se dizer que a China aproveitou o desvio de atenção de Washington, mas também deveu ajustar sua política em relação com áreas-chave (como Ásia Central) onde os EUA, em virtude da guerra contra o terrorismo, elevou a uma presença de grande valor estratégico e que facilitava o cerco à China. É o caso da Ásia Central, região-chave não só pela energia, mas também pelo comércio ou a segurança, ansiando a China diversificar os riscos com corredores que lhe una com a Europa, sua principal sócia comercial.

O poder suave da China e suas capacidades militares e estratégicas também progrediram após o 11-S, mas não até o ponto de supor um desafio iminente para os EUA, especialmente no segundo, apesar deste seguir muito de perto sua evolução. Em qualquer caso, faria mal Pequim em sobre-estimar o debilitamento do Ocidente. É de supor que essa será uma das principais conclusões do atuar de sua diplomacia na Líbia.

A guerra contra o terrorismo brindou a Washington um argumento de difícil contestação e grande utilidade para conter a China, principal preocupação estratégica da Administração estadunidense então e agora. Mas os fatos vieram demonstrar que as enormes capacidades potenciais da China são muito difíceis de conter operando no exterior sobre aqueles fenômenos ou espaços que poderão dificultar seu processo. No final das contas, sua capacidade de resistência é equivalente ou superior, dadas suas dimensões territoriais ou demográficas e a intensidade e pluralidade de suas relações externas.

É sabido que a única forma verdadeiramente eficaz de impedir a consolidação da China como superpotência do século XXI consiste em quebrar seu processo interno, incidindo em sua desmembração territorial ou em sua soberania ou estabilidade política (em um país cujo PIB per capita ocupa a posição 105 em nível global e em 92 em desenvolvimento humano), ambos aspectos, apesar de tudo, de difícil execução, ao menos no momento.

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