Em 1928, o VI Congresso do Comitern sancionava uma "viragem para a esquerda", punha fim à política de "frente operária unida" (tam solicitada polo POUM e Andreu Nin no Estado espanhol anos depois) e a socialdemocracia devia ser descrita pelos comunistas como socialfascismo.
Estaline, na aspiração de construir o "socialismo num só país" precisava desesperadamente laços comerciais com os estados capitalistas avançados para trocar cereais soviéticos e outras matérias e recursos que lhe permitiram a aquisição de tecnologia e conhecimentos para a industrialização. O Comissário do Povo para Assuntos Externos e ex-menchevique, Georgi Chicherin, cuidava com acerto que era um disparate perigoso denunciar a outros socialistas como socialfascistas e tratou de comunicar a sua opinião à liderança soviética. Porém a ideia que corria na altura de que Estaline confiava a política externa a terceiros enquanto se centrava nas manobras internas do partido e na transformação económica da URSS era falsa, por muito que ele não dirigia o Comitern nem o Comissariado do Povo para os Assuntos Externos que pareciam modelar a política externa. A realidade é que ninguém se atrevia a tomar qualquer iniciativa sem consultar a Estaline (incluindo aqui os integrantes do Politburo).
No entato, isto não contradiz as intervenções de Chicherin, já que a função deles era o conhecimento factual e técnico. Ora, toda vez que o Politburo definia uma linha devia implementar-se sem crítica nenhuma como técnicos, que não políticos na verdade, da diplomacia soviética. A liderança soviética centrava-se nos planos quinquenais e em esganiçar um isolamento que apercebiam perigoso para a sobrevivência face os estados capitalistas.
Bukharine (que já em julho de 1929 escreveu a Estaline "Não pretendo lutar, nem lutarei") foi apartado do Comité Executivo do Comitern em abril de 1928, no tempo em que Jules Humbert-Droz afirmava que os discursos de Estaline eram um campo de mentiras, que Angelo Tasca dizia dele que era o "porta-estandarte da contra-revolução", que György Lukácks e Antonio Gramsci protestavam pelo desprezo dos PC perante as reformas democráticas na Europa. A quinta-feira 29 de outubro desse ano estourava após semanas caóticas nos mercados de acções o pânico entre corredores e banqueiros e, ao tempo que as acções se mal vendiam a um ritmo aloucado, a bolsa de Nova Iorque (a da principal potência emergente na altura da hegemonia británica) fazia crack.
Neste cenário a radicalização da estratégia comunista da Comitern parecia acertada: quanto pior melhor. Ou seja, que o desemprego, a inflação (que golpeavam Alemanha como nenhum outro estado capitalista) e uns ordenados que não cobriam as despesas correntes eram o cenário sonhado por Estaline e os comunistas. Hitler e os nazis eram tratados como simples sintoma da podredume do capitalismo. No entanto, na esquerda existiam vozes que advertiam do perigo do nazismo. Trotski indicava que Mussolini era mau e que Hitler seria ainda pior. Advertia, ao igual que Bukharine dos perigos da política de extrema-direita e do fascismo em Europa e sabia que as suas primeiras acções seriam suprimir os partidos comunistas dos seus respectivos estados. As organizações fascistas e de extrema-direita subiam como a escuma por toda a Europa central e oriental quanto recrudescia a crise económica e social. Hitler e o NSDAP beneficiaram-se enormemente da depressão económica alemã, enquanto Estaline dava instruções ao Comitern para que os PC atacaram os outros partidos de esquerda, já que social-democratas, trabalhistas e outros partidos de esquerda eram promotores do "social-fascismo" e, portanto, havia que abandonar a política de frente operária unida para adentrar-se num esquerdismo próprio de A doença infantil do comunismo, que Lenine escrevera.
Em Alemanha os comunistas foram à greve geral sem sucesso já que os trabalhadores temiam perder o emprego devido à crise e o alto desemprego. O Partido Comunista polemizava com seus irmãos. Tanto eles como o SPD eram praticamente hegemónicos entre a classe trabalhadora, mas a ruptura da frente operária unida conduziu para o mais grande dos fracassos. Enquanto em 1932 os nazis conquistavam o maior número de votos e arrincavam de Hindenburgo a chancelaria (30-1-1933) os comunistas e os social-democratas brigavam pelas ruas de Berlim. Ao tempo, a URSS mantinha relações com a Itália fascista a pesar de que Mussolini perseguira o PCI. Hitler, no entanto, suprimiu o tratado de Rapallo e em 1922 restringiu os laçoes económicos o que obrigou a Estaline a procurar um novo sócio preferente no caminho para a industrialização: os EUA. A Ford Motors, por exemplo, cedeu encantada equipamento e especialistas para a enorme fábrica de carros de Nizhni Novgorod, ao tempo que Roosevelt aplanava o caminho para o reconhecimento diplomático da URSS.
Não foi então até que o fascismo triunfou claramente com as suas piores roupagens que o Comitern reagiu. Agás China e a URSS, Checoslováquia e França contavam com os maiores PC do mundo e foi lá onde as bases esganaram a linha do Comitern para evitar a sorte dos seus homólogos italianos e alemães. Em fevereiro de 1934 os militantes social-democratas e comunistas organizaram juntos em Paris uma greve geral obviando todo o que Maurice Thorez (na altura líder do PCF) dizia. A URSS entrava na Liga de Nações, até há pouco descrita como uma organização das potências capitalistas ganhadoras da Grande Guerra para manterem o seu domínio global, para limitar a expansão do Japão e da Alemanha.
Assim as coisas, o Comitern teve de recuar. Agora, os liberais, os social-democratas e os comunistas uniam-se no anti-fascismo e nas frentes populares, como a que triunfou em fevereiro de 1936 na II República espanhola, embora lá o PCE tinha uma implantação social na altura "testemunhal". O PCF fora também pioneiro ao juntar-se a socialistas e liberais em julho de 1935 dando a presidência a León Blum (embora sem entrar em carteiras ministerais em maio de 1936) e com Thorez falando de que "temos de saber como terminar uma greve" perante o auge da conflituosidade social. A esquerda voltava a tender pontes de fraternidade sobre um inimigo comum que avalava Europa mas Alemanha e Itália já estavam perdidas e a prediçao de Lenine duma sequência de guerras mundiais tornava-se a cada passo mais certa e, de facto, o fim da Guerra Civil espanhola em 1936 precederia em poucos meses ao começo da II Grande Guerra. Aguardaremos novamente a que seja demasiado tarde ou pularemos em todo Estado espanhol (desde a diversidade, o diálogo e a fraternidade e com um programa de quebra democrática) pela política da frente comum? A credibilidade da esquerda perante amplas capas sociais passa, sem dúvida, por este caminho...
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4 comentários:
Unha parábola espazo-temporal que obriga á reflexión. Coma todos os teus artigos. Gostei.
Obrigado Nair, mas a angústia que sinto vai em aumento. Estamos às portas dum verdadeiro cataclismo onde viveremos a miséria em carne própria, nós mesmos, os nossos seres queridos... e aqui gastamos o tempo em estériles disputas entre nós que apenas fam mais forte ao novo fascismo.
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A globalizaçom sempre remata no "salve-se quem poda" o melhor cenário para lutas fraticidas e para o ascenso do fascismo perante umha classe meia (a clássica pequena-burguesia desiludida com a "esquerda"). Umha aperta fraternal e confiemos no optimismo da vontade sem esquecer os motivos do pessimismo da razom.
Grande parábola histórica, si, e dá medo. A ver se andan as cousas por eses regos que dis ao remate...
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