Esta noite vou criticar a teoria do trabalho precário, tal como a venhem desenvolvendo alguns marxistas autonomistas italianos, particularmente Antonio Negri, Paolo Virno e tamém Michael Hardt. Falo de "teoria", porque as ideias que Negri e outros venhem artelhando fai tempo vam além dumha simples descriçom dos trocos na organizaçom do trabalho que se sucedêrom na década de 80 e 90 da mao dum processo de globalizaçom que trouxo consigo a "precarizaçom do trabalho", umhas relaçons laborais crescentemente discontinuas, a introduçom do "tempo flexível" e umha paulatina fragmentaçom da experiência laboral. A opiniom destes atuores sobre o trabalho precário está totalmente marcada por umha determinada perspetiva de conjunto sobre a natura do capitalismo e dos conflitos dos nossos dias. E cumpre apresurar-se a dizer que se trata aqui nom de simples ideias que moram nas cabeças dum feixe de inteletuais, mas de teorias que circulam cumpridas desde fai anos dentro do movimento italiano, e que recentemente tamém tenhem influência nos EUA. Som, portanto, teorias que em nossa opiniom chegárom a cobrar releváncia.
Historia e orige do trabalho precário e da teoria do trabalho imaterial.
A minha premisa inicial é a seguinte: é induvitávelque o problema do trabalho precário deve estar na nossa agenda. E nom se trata simplesmente de que as nossas relaçons com o trabalho assalariado sejam agora mais discontínuas, mas tamém de que a discusom sobre o trabalho precário é crucial para entendermos como é que podemos superar o capitalismo. As teorias que discuto captam aspeitos importantes dos trocos que tivérom lugar na organizaçom do trabalho, certo é; todavia tamém nos retrotraem a umha conceçom machista do trabalho e da luita social. Discutirei agora os aspeitos que para a minha crítica desta teoria resultam mais pertinentes.
Un suposto importante da teoria autonomista italiana sobre o trabalho precário é que a precarizaçom laboral –desde finais da década de setenta até o presente— fui a resposta capitalista às luitas de classe da década de sessenta, umha luita centrada no rejeitamento do trabalho, tal e como se expresava na consigna: “mais dinheiro e menos trabalho”. Foi umha réplica a um ciclo de luitas que punham em jaque o controlo capitalista do trabalho, um recusamento da disciplina capitalista laboral por parte dos trabalhadores, o recusamento dumha vida organizada em funçom das necessidades da produçom capitalista, dumha vida consumida na fábrica ou a oficina.
Outro tema importante é que a precarizaçom das relaçons laborais afunde as suas raízes numha permutaçom do trabalho industrial por um trabalho que Negri e Virno denominam “imaterial”. Negri e outros quantos argumentam que a reestruturaçom da produçom que tivo lugar entre a década de oitenta e a década de noventa, entendida como resposta às luitas da década de sessenta, produziu um processo em que o trabajo industrial foi substituída por um tipo diferente de trabalho, tal e como anteriormente o trabalho industrial substituira o trabalho na agricultura. E denominam a este novo tipo de trabalho “labor imaterial”, pois argumentam que a computaçom e a revoluçom da informaçom produzírom mudanças nas formas de trabalho. No mundo capitalista de hoje, a tendência principal orientaria-se a umha forma dominante de trabalho que nom produziria objetos físicos, mas informaçom, ideais, estados de cousas, relaçons.
Por outras palavras: o trabalho industrial –hegemónico nas fases prévias do capitalismo— já nom é tam importante, já nom é o motor do desenvolvemento capitalista. No seu lugar encontramos “trabalho imaterial”, trabalho cultural, cognitivo e trabalho “info”.
Os autonomistas italianos acreditam que a precarizaçom do trabalho e a apariçom do trabalho imaterial tornou realidade a prediçom de Marx nos Grundrisse, nessa famosa seçom sobre as máquinas em que Marx afirma que com o desenvolvemento do capitalismo, o processo de produçom capitalista depende cada dia menos do trabalho vivo e cada dia mais da integraçom da ciência, o conhecimento e a tecnologia, que se convertem no motor da acumulaçom. Virno e Negri acreditam que o deslocamento para o trabalho precário torna realidade essa prediçom sobre a tendência histórica do capitalismo. Assi a crescente importáncia do trabalho cognitivo e o desenvolvimento do trabalho computacional nos nossos tempos se considera como parte dumha tendência histórica do capitalismo rumo à reduçom do trabalho.
A precaridade do trabalho seria consequência das novas formas de produçom. É provável que a virage para o trabalho imaterial gere precarizaçom das relaçons laborais, porque a estrutura do trabalho inteletual é diferente do trabajo industrial, do trabaho físico. O trabalho inteletual e da informaçom descansa menos na presença física contínua do trabalhador no tradicional lugar de trabalho. O ritmo do trabalho é muito mais intermitente, fluído e discontínuo.
Em síntese, o desenvolvimento do trabalho precário e o desvio ara o trabalho inteletual nom aparecem - aos olhos de Negri e outros autonomistas marxistas — como um fenómeno completamente negativo. A contrário, vem-no como expressom dumha tendência para a reduçom do trabalho e, mesmamente por isso, da exploraçom: como o resultado dum desenvolvimento capitalista que responde ao conflito de classes.
Isto significaría, hoje, que o desenvolvimento das forças produtivas permitiria-nos enxergar um mundo capaz de trascender o trabalho; um mundo em que nos libertariamos da necessidade de trabalhar, umha via que conduze rumo ao reino da liberdade.
Os marxistas autonomistas acreditam que este desenvolvimento tamém está criando umha nova forma de “common” ou bens comuns, pois parece-lhes de todo ponto possível que o trabalho imaterial represente um chimpo avante na socializaçom e homogeneizaçom do trabalho. A ideia é que se teriam apagado as outrora decisivas diferenças entre distintas formas de trabalho (trabalho produtivo / reprodutivo, trabalho na indústria / agricultura, trabalho de cuidado), porque todas elas (como tendência) resultariam assimiladas na medida em que começam a incorporar o trabalho cognitivo. E ainda mais, todas as atividades que de maneira crescente se incorporam ao desenvolvimento capitalista contribuem para o processo de acumulaçom, e a sociedade converte-se numha inmesa fábrica. É assi que, por exemplo, a distinçom entre trabalho produtivo e improdutivo esfuma-se.
E isto significa que o capitalismo nom só nos conduziria mais alá do trabalho, mas que estaria sentando as bases mesmas para convertir a nossa experiência de trabalho em algo "comum" aí onde as divisons começasm a desmoronar-se.
É relativamente simples averiguar por quê é que essas teorias se fixérom populares. Contenhem elementos utópicos especialmente atrativos para os trabalhadores cognitivos, o "cognitariado" como o denominam Negri e outros ativistas italianos. Com a nova teoria aparece um novo vocabulário. "Cognitariado", em vez de proletariado. Em vez de classe operária, "multitude", provavelmente porque o conceito de multitude exprime a unidade criada pola nova socializaçom do trabalho, a comunalizaçom do processo de trabalho, a ideia de que dentro do processo de trabalho os trabalhadores os trabalhadores som cada dia mais homogéneos, pois todas as formas de trabalho incorporam trabalho cognitivo, computacional, comunicacional e assi seguido*.
Como dixem, esta teoria alcançou um alto grau de popularidade porque hai umha geraçom de ativistas jovens - com vários anos de formaçom e pós-graus- que agora estám empregados em trabalhos precários nas distintos ramos da indústria cultural ou na indústria de produçom do conhecimento. E entre eles essas teorias som muito populares, porque sugírem-lhes que a pesar da miséria e da exploraçom que experimentam, no entanto movemo-nos para um nível mais alto de produçom e de relaçons sociais. É umha geraçom de trabalhadores que considera o horário laboral de "nove a cinco" como umha regra carcelária. Para eles a precaridade outorga-lhes novas possibilidades que os seus pais nom tivérom, mas sonhárom. O varom moço de hoje, por exemplo, nom é tam disciplinado como o fôrom os seus pais; e esses pais ainda eram capazes de esperar que a sua esposa ou companheira fora economicamente dependente del. Agora eles contam com relaçons sociais que suponhem menor dependência financeira. A maioria das mulheres tenhem acesso autónomo a umha renda e com frequência negam-se a ter crianças.
Esta teoria apela a umha nova geraçom de ativistas que, embora as ficiculdades inerentes do trabalho precário, fantaseia neste tipo e atividade algumhas possibilidades. E estes teóricos proponhem começar por aí, sem interessar-se pola luita polo pleno emprego. Porém tamém hai umha diferença entre Europa e os EUA. Por exemplo, em Itália dentro desse movimento, hai umha demanda de rendas garantidas. Chamam-no "seguridade da flexibilidade". O que dim é o seguinte: nom temos um emprego, somos precários porque o capitalismo necessita que o sejamos, entom devem pagar por isto. Houvo mobilizaçons que durárom vários dias, especialmente o 1 de Maio, e a consigna central era o ingresso garantido. O 1 de Maio deste ano, em Milám, gente do movimento passeou a "Sam Precário", o santo patrono dos trabalhadores precários. Este icono irónico aparece em concentraçons e demonstraçons centradas nas questons do trabalho precáro.
Crítica do trabalho precario e de su apologia indireta
A partir de aqui farei umha crítica dessas teorias, umha crítica do ponto de vista feminista. Nom é que ao expor a minha crítica queira minimizar a importáncia das teorías que tereide discutir. Estas teorias nutrírom-se de muitas organizaçons e luitas políticas relacionadas com os trocos na organizaçom do trabalho que afetárom as nossas vidas. Recentemente, na Itália, o trabalho precário foi um dos principais lemas das mobilizaçons, junto da luita polos dereitos dos imigrantes.
Nom quero minimizar o valor do trabalho que se realiza em relaçom com os temas da precariedade. É evidente que na última década assistimos a um novo tipo de luita. Um novo tipo de organizaçom cindida dos confins do posto de trabalho tradicional. Onde o puesto de trabalho era a fábrica ou a oficina, agora vemos um novo tipo de luitas que saem da fábrica para o “território”, conetando distintos lugares de trabalho e construindo movimentos e organizaçons afincadas num território. As teorias do trabalho precário tentam dar conta das novidades na organizaom do trabalho e da luita, e tamém pretendem entender as formas emergentes de organizaçom.
E isto é muito importante. Ao mesmo tempo, penso que aqueilo que denominou teoria do trabalho precário tem defeitos sérios, que já assinalei na minha apresentaçom. No que se segue resumirei as críticas e logo discutirei as possíveis alternativas.
A minha primeira crítica é que esta teoria construi-se sustidamente numha conceçom completamente equivocada sobreo modo em que opera o capitalismo. Vem o desenvolvimento capitalista movendo-se para formas mais altas de produçom e de trabalho. Em Multitude, Negri e Hardt chegam a dizer que o trabalho se está fazendo mais intiligente. O suposto é que a organizaçom capitalista do trabalho e o desenvolvimeto capitalista estariam criando já as condiçons para superar a exploraçom.
Seria incluso possível que a casca protetora desta sociedade chegara a colasar, o que trairia consigo a libertaçom das potencialidades urdidas e crescidas no seu seio. Fantaseia-se com que um processo assi está já em marcha na atual organizaçom da produçom. O meu ponto de vista é que todo isto nom é mais do que um penoso malentendido sobre os efeitos da reestruturaçom induzida pola globalizaçom e o giro ultraliberal.
O que Negri e Hardt nom advirtem é que o tremendo custo do salto tecnológico necessário para a computarizaçom e a integraçom da informaçom no processo de trabalho pagou-se a expensas dum gigantesco crescimento da exploraçom no outro extremo do processo. Existe um fio de continuidade entre o trabalhador da computaçom e o trabalhador do Congo que extrai o coltao com as suas próprias maos para sobreviver, antes de ser expropriados e depauperados polas repetidas rondas de ajustes estruturais ou dos constantes roubos de terras e recursos naturais comunitários.
O princípio fundamental é que o desenvolvimento capitalista é, sempre e ao mesmo tempo, um processo de subdesenvolvimento. Maria Mies descreve-o eloquentemente nos seus trabalhos: "O que numha parte do capitalismo se apresenta como desenvolvimento, noutra fai-no como subdesenvolvimento".
Estas teorias ignoram por completo esse vencelho crucial, porque estám de todo ponto penetradas polas ilusom de que o processo do trabalho está-nos unindo. Quando Negri e Hardt falam de que o trabalho se está "volvendo comum" e usam o conceito de "multitude" para referir-se a essa nova forma "comum" supostamente construído polo desenvolvimento das forças produtivas som cegos perante o que ocorre perante o proletariado mundial.
Cegos porque nom vem a destruiçom de vidas e do meio ambiente que produze o capitalismo. Nom vem que a reestruturaçom da produçom tem como objetivo reformar e profundizar as divisons dentro da classe trabalhadora, em lugar de apagá-las. A ideia de que o desenvolvimento do microchipe está criando novos bens comuns e novos comunários ou pode ser mais desacertada; o comunalismo só pode ser o produto da luita, nunca da produçom capitalista.
Umha das minhas críticas a Negri e Hardt é que parecem acreditar que a organizaçom capitalista do trabalho é a expresom dumha racionalidade mais elevada, e que o desenvolvimento capitalista é necessário para criar as condiçons materiais para o comunismo. Estre crença é central na sua teoria do trabalho precário. Podemos discutir se esta crença representa ou nom o pensamento de Marx. É certo que o Manifesto fala do capitalismo nestes termos; tamém algumhas seçons dos Grundrisse. Porém nom é claro que isto seja um tema dominante no trabalho de Marx, e desde logo nom no Capital.
Trabajo precário e trabalho reprodutivo
Outra das minhas objeçons à teoria do trabalho precário é que se apresenta como neutral perante o tema do género. Assume, sem mais, que a reorganizaómda produçom está eliminando as relaçons de dominaçom e as hierarquias que existem dentro da classe trabalhadora em funçom da raça, sexo e idade e, portanto, nom se ocupa de tratar essas relaçons de poder e carece das ferramentas teóricas e políticas para pensar como abordá-las. Negri, Virno e Hardt nom discutem como é que foi e continua sendo usado o ordenado para organizar ditas divisons e como, portanto, devemos focar as luitas polo ordenado para que nom se convertam num instrumento para futuras divisons, senom que, a contrário, nos ajudem a socavá-las. É isto, em minha opiom, um dos temas principais que devemos abordar no movimento.
O conceito de "multitude" sugire que todas as divisons dentro da classe trabalhadora se apagárom ou que já nom som politicamente relevantes. Obviamente trata-se dumha ilusom. Algumhas feministas assinalam que o trabalho precário nom é um fenómeno novo. As mulheres sempre tivérom umha relaçom precária com o trabalho assalariado. Porém a crítica vai muito mais longe.
Preocupa-me que a teoria negriana do trabalho precário ignore e passe por cima umha das contribuiçons mais decisivas da teoria e da luita feministas: a redefiniçom do trabalho e o reconhecimento de que o trabalho reprodutivo impagado femenino é um recurso fundamental da acumulaçom capitalista. Ao redefinir o trabalho doméstico como trabalho, e nom como um serviço pessoal; ao definí-lo como um trabalho que produze e reproduze a força de trabalho, as feministas descobrírom um novo e profundo modo de exploraçom que Marx e a teoria marxista passárom praticamente por alto. Todas as intuiçons politicamente importantes contidas neste tipo de análises esfumam-se agora, ao nom outorgar-se-lhes a menor importáncia na compreensom da atual organizaçom da produçom.
Hai um eco impercetível dos análises feministas na teoria, umha espécie de apoio de boca pra fora, quando se inclui à "laboura efetiva" dentro das atividades laborais qualificadas como "laboura imaterial". Todavia, os mais que chegam a reconhecer é o caso do trabalho das aeromoças ou dos serviços de comida nas empresas: as chamadas trabalhadoras às que chamam "afetivas", porque supom-se que devem sorrir aos seus clientes.
Porém o quê é que é a laboura afetiva? E por quê é que se inclui na categoria de trabalho imaterial? Imagino que a incluim - você vaia saber — porque nom produze produtos tangíveis, mas "estados afetivos", isto é, sentimentos. E novamente, para dizí-lo sem tapulhos, penso que isso é atirar-lhe um ossinho ao feminismo, que é agora umha perspetiva que goza de certo apoio social e já nom pode ser ignorada.
Porém o conceito de "laboura afetiva" evapora todo o poder desmitificador da análise feminista do trabalho doméstico. De feito, volve a introduzir o trabalho doméstico no ámbito da mistificaçom ao sugerir que a laboura reprodutiva só tem a ver com a produçom de "emoçons", "sentimentos". Adoita chamar-se-lhe o "trabalho do amor", e agora Negri e Hardt, em troca, descobrírom que se trata de "afeto"**.
A análise feminista da funçom da divisom sexual do trabalho, da funçom das hierarquias de género, a análise do modo em que o capitalismo usou o ordenado para mobilizar o trabalho femenino de reproduçom da força de trabalho, todo isto evapora-se sob a etiqueta de "trabalho afetivo".
Que Negri e hardt ignorem totalmente esta análise feminista, confirma as minhas suspeitas de partida: esta teoria expressa os interesses dum grupo seleto de trabalhadore, juntos e revoltos na grande panela a pressom da Multitude. Em verdade, a teoria do trabalho precário e imaterial ocupa-se da situaçom e dos interesses dos trabalhadores do nível mais alto da tecnologia capitalista. O seu desinteresse polo trabalho reprodutivo e a sua presunçom de que todo trabalho é comum, acocha o feito de que se ocupam dos setores mais privilegiados da classe trabalhadora. E isto significa que nom é umha teoria que podamos usar para construirmos um movimento que se autorreproduza de maneira verdadeira.
Para esta tarefa, ainda é hoje essencial a liçom do movimento feminista. Na década de setenta o feminismo tentou entender as raízes da opresom e a exploraçom das mulheres e as hierarquias de género. As feministas descrevem tais fenómenos como produto dumha desigual divisom do trabalho, que força às mulheres a trabalhar para a reproduçom da classe trabalhadora. Esta ideia foi decisiva para umha crítica social radical, e as suas consequências precisam ainda de sere entendidas e desenvolvidas em todo o seu potencial.
Quando nós dizimos que o trabalho doméstico é verdadeiramente trabalho para o capital; que se bem é trabalho impagado ainda contribui para a acumulaçom do capital, estamos dizendo algo importantíssimo sobre a natura do capitalismo como sistema de produçom. Afirmamos que o capitalismo se construti sobre umha imensa soma de trabalho impagado, e que nom se erige exclussiva ou primariamente fundado em relaçons contratuais; tamém dizemos que a relaçom salarial oculta o trabalho impago, escravo, tal e como é a natureza de grande parte do trabalho que fai possível a acumulaçom de capital.
Destarte, quando dizimos que o trabalho doméstico nom só reproduze a "vida", mas tamém a "força de trabalho", começamos por xebrar duas esferas distintas da nossa vida e trabalho que aparentemente está indisoluvelmente conetadas. Começamos a ser capazes de conceber umha luita em contra do trabalho doméstico entendida agora como a reproduçom da força de trabalho, que é a reproduçom do bem mais importante que tem o capital: " a capacidade de trabalho", a possibilidade de que os trabalhadores resultem explorados. Por outras palavras, reconhecer que aquilo que denominamos o "trabalho reprodutivo" é um ámbito de acumulaçom e, portanto, tamém de exploraçom, permite-nos tamém ver a reproduçom como um lugar de luita e, o que é mais importante, concebí-la como umha luita anti-capitalista em contra do trabalho reprodutivo, que nom nos destruirá nem a nós nem as nossas comunidades.
Como é que luitamos em contra do trabalho reprodutivo? Nom é o mesmo que luitar no posto de trabalho na fábrica –por exemplo, a luita em contra da velocidade na linha da montage—, porque do outro lado da luita hai pessoas e nom cousas. Umha vez que dixemos que o trabalho reprodutivo é um ámbito de luita, de imediato devemos perguntar-nos como luitar nesse terreno sem destruir as pessoas que estám ao nosso cargo. Esse é o problema que conhecem bem as mais, as mestras e as enfermeiras.
Por iso é tam importante poder traçar umha separaçom entre a criaçom de seres humanos e a reproduçom dos mesmos entendidos como força de trabalho, como futuros trabalhadores que, por isso mesmo, necessitam ser treinados e nom necessariamente em función das suas necessidades e desejos, mas que devem ser disciplinados e sometidos a regras dum tipo particular.
Por exemplo, foi importante para as feministas advertir que parte do trabalho doméstico e de criança dos meninos é trabalho policial para con eles, para que se adatem a umha disciplina laboral particular. Começamos a ver, entom, que repudiar determinados ámbitos laborais nom só nos pode liberar a nós próprias mas tamém aos nossos filhos. Pudemos advertir que a luita nom se realiza a expensas daqueles a quem cuidamos, ainda que passemos por cima preparar a comida e limpar os prédios. De facto a nossa negativa abre um caminho para a sua própria luita e para o processo da sua libertaçom.
Umha vez visto que em lugar de reproduzir a vida estamos expandindo a acumulaçom capitalista e que começamos a definir o trabalho reprodutivo como um trabalho para o capital, tamém abrimos a possibilidade dum processo de recomposiçom das relaçons entre as mujeres.
Por exemplo, pensemos no movimento das prostitutas a quem agora chamamos movimento das “trabalhadoras do sexo”. As origes deste movimento na Europa remontam-se a 1975, quando um grupo de trabalhadoras do sexo em Paris ocupou umha igreja como forma de protesto contra umha nova regulaçom por zonas, que elas vírom como um ataque a sua seguridade. Houvo umha clara relaçom entre luita -que logo se propagou por toda Europa e nos EUA- e o movimento feminista que estava volvendo a pensar e questionar o trabajo doméstico. A possibilidade de dizer que a sexualidade era um trabalho para as mujeres conduziu a umha nova maneira de pensar as relaçons sexuais, incluídas as relaçons gay. Debido aos movimentos feministas e gay, começamos a pensar nas formas em que o capitalismo explorou a nossa sexualidade para fazê-la “produtiva".
Para concluir, fou um avanço importante que as mulheres puderam começar a entender o trabalho impago e a produçom que se realiza dentro e afora do fogar como a reproduçom da força de trabalho. Isto permitiu repensar cada aspeito da vida quotidiana –criança de nenos, relaçom entre homes e mulheres, relaçons homossexuais e a sexualidade em geral—, todo isto em funçom da exploraçom e a acumulaçom capitalista.
Para crear un movimento que se autorreproduça
Na medida em que fomos capazes de pensar que qualquer aspeito da vida quotidiana é potencialmente libertadora ou explotadora, tamém pudemos decatar-nos das distintas maneiras em que se enlaçan as mulheres e as luitas das mulheres. Descubrimos a possibilidade de “alianças” que nom imaginaramos e a possibilidade de superar as divisons que se criaram entre as mulheres, tamém sobre a base da idade, raça, e preferência sexual.
Nom podemos construir um movimento sustentável sem entender essas relaçons de poder***. Tamém necessitamos apreender várias cousas das análises feministas do trabalho reprodutivo, porque nengum movimeento pode sobreviver a menos que se interesse poa reproduçom dos seus membros. Esta é umha das debilidades do movimento pola justiça social dos EUA.
Assistimos às manifestaçons, organizamos atos, e isto é o máximo que fazemos na nossa luita. Porém a análise sobre como é possível reproduzir o movimento e reproduzir-nos a nós próprios nom está no centro da organización del propio movimiento. É preciso que volvamos à tradiçom histórica da classe trabalhadora e organicemos umha “ajuda mútua”, e que volvamos a pensar tal experiência, nom necessariamente para resucitá-la, mas para nutrir-nos dela no presente.
É precisso construir um movimento que na sua agenda incluia as condiçons para a sua própria reproduçom. É necessário que a luita anti-capitalista invente distintas alternativas e seja capaz de construir as suas próprias vias de reproduçom de maneira coletiva.
Devemos assegurar-nos de que nom só confrontamos o capital no intre das manifestaçons, mas que o fazemos coletivamente e em todo momento das nossas vidas. O que ocorre internacionalmente é prova de que só quando contamos com formas coletivas de reproduçom, de que só quando temos comunidades que se reproduzem a si próprias de maneira coletiva, podem entom as nossas luitas mover-se e orientar-se nom sentido radicalmente pugnaz face a orde estabelecida; aí estám, por assinalado exemplo, as luitas dos povos indígenas contra a privatizaçom da auga ou contra as comanhias de petróleo que destróim as terras dos indígenas em Equador.
Desejo fechar esta disertaçom dizendo o siguiente: se reparamos nos exemplos de luitas em Oaxaca, Bolívia e Equadro, veremos que os confrontos mais radicais nom som os que iniciam os trabalhadores "cognitivos", ou os que surgem em virtude dos "bens comuns" da Internte. A fortaleza do povo de Oaxaca, por exemplo, reside na profunda solidarieade que liga os que luitam, umha solidariedade que fixo possível o apoio doutros povos indígenas de todo o território do Estado mexicano: chamárom-nos "mestres", e vírom-nos como membros da sua própria comunidade. O mesmo em Bolívia: o povo que impediu a privatizaçom da auga tem umha longa tradiçom de luita comunal. Este tipo de luitas é o que devemos incluir na agenda , construir este modo de solidariedade e entender de quê maneira podemos superar o que nos divide. E para concluir, o principal problema da teoria do trabalho precário é que nom nos dá a menor ferramenta para superar o modo em que fomos divididos. E o certo é que essas divisons, continuamente recreadas e reproduzidas, som a nossa principal debilidade em relaçom com a capazidade para resistir a exploraçom e criar umha sociedade equitativa.
** Resulta bastante clara ao respeito a seguinte cita de Engels em A família, a propriedade e o estado, pertencente ao capítulo 9 "Barbárie e civilización":
O trabalho doméstico da mulher perdia agora a sua importáncia em comparança com o trabalho produtivo do home: este trabalho era-o todo; aquel, um acessório insignificante. Isto demonstra já que a emancipaçom da mulher e a sua igualdade com o home som e seguirám sendo impossíveis enquanto fique excluída do trabalho produtivo social e confinada dentro do trabalho doméstico, que é um trabalho privado. A emancipaçom da mulher só se fai possível quando esta pode participar em grande escala, em escala social, na produçom, e o trabalho doméstico nom lhe ocupa apenas um tempo insignificante. Esta condiçom só pode realizar-se com a grande indústria moderna, que nom permite apenas o trabalho da mulher em grande escala, mas que até o exige e tente mais e mais a transformar o trabalho doméstico privado em indústria pública.
*** Sobre a conveniência ou nom da palavra "sustentabilidade" consulte-se o seguinte artigo:
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