15/09/2010

Schopenhauer: um século e meio a cara de cam

Shopenhauer. Artigo tirado de aqui. A traduçom para o galego-português é de nosso.



O pesimismo do filósofo alemám celebra um dos momentos mais propícios para voltar à crítica capitalista que lançou há 150 anos, com obras reditadas e inéditas.

A anedota nom fai mais que incidir na troça: de caminhata pola cordilheira do Tauus (Alemanha) um paxaro soltou o que lhe sobrava sobre o branco chaleque dum dos seus companheiros de travessia. "Vê você?", dixo o filósofo pessimista Arthur Schopenhauer burlando-se. "Levo razom com a minha teoria de que vivemos no pior dos mundos imagináveis". "A contrário - contestou o danificado- a mim parece-me que o mundo é ainda suportável. Imagine-se que foram as vacas as que pudessem voar!".

A sua mai escreve-lhe com desar umha carta em 13 de Dezembro de 1807, quando Arthur tem 19 anos de idade: "Durante os dias que tenham lugar as minhas reunions podes ficar a cear comigo, com tal de que te abstenhas das tuas penosas disputas, que me incomodam, assim como todas as tuas queijas sobre este estúpido mundo e a miséria humana, porque todo isso fai-me passar mal a noite ou ter maos sonhos, e eu gosto de durmir bem".

Noutra carta, por se nom lhe ficara em claro ao jovem cinsento, Johanna insiste-lhe sobre as suas participaçons na sala de chá entre os amigos das sua mai, aos que aleiçoava sobre a verdadeira situaçom do mundo: "Ninguém está disposto a soportar um comportamento coma o teu e deves mudar ou afundiras-te. Afundiras-te e esmagarám-te e treparam-te no chao", franca e directa, cruel e exagerada. Nom soportava que os convidados remataram por enfrentar-se a ele.


Obscuro, mas sem exagero

Após 150 anos do seu passamento, a má sombra com a que Schopenhauer lacerou a sociedade em que vivia segue lastrando preconceitos. "O pessimismo de Schopenhauer concibe-se como sempre de maneira desproporcionadamente exagerada e move directamente à troça ou nalgum outro tipo de rejeitamento", escreve o publicista e sociólogo Volker Spierling (Francoforte, 1947) no seu livro Arthur Schopenhauer (que agora publica Herder Editora ao fio da efeméride).

Em 1833 retira-se às montanhas de Francoforte, a um bom refúgio de eremita, afastando-se da frustraçom da sua carreira académica em Berlim, onde os grandes aparatos teóricos de Hegel esmagam a sua projecçom e defenestram-no, algo que nunca lograria superar. De facto, no inédito ao castelhano Senilia. Reflexiones de un anciano (Herder) aproveita para atacar a todos os que o assinalárom e se troçárom o seu pessimismo metafísico.

O próprio tradutor da obra, Roberto Bernet, aponta que é umha velha ferida incurável. "O livro compom-se de comentários, dos depoimentos que deixous escritos em quadernos. Senilia era um projecto de livro e como tal estava simplesmente esboçado. Daí que a traduçom tenha sido complicada porque há reflexons entrecurtadas, sem rematar ou inconexas", explica Bernet quem destaca as reflexons do filósofo sobre a decadência no uso da linguagem. Tampouco deixa passar outros aspeitos antipáticos como "o seu alto despreço pola mulher, era um misógeno terrível e isso fica patente em Senilia.

Em Francoforte, retirado do mundanale violento ruído, Schopenhauer escreve a maior parte das suas obras. O seu aspecto exterior resulta chamativamente estranho, com roupas passadas da moda, sempre acompanhado do seu caniche e confirmando que se sente um estranho entre extranhos na sua época, que também lhe resulta alheia: "A minha época e eu discordamos mutuamente", dixo.

No entanto, a imagem do filósofo pessimista nunca deixou ver as árvores. " Sim, dá soluçons a grandes problemas. Nom é um pessimista niilista como os estoicistas. Shopenhauer está em contra do home sem ilusom e acabado por dentro, alheios às suas possibilidades de desmontar o seu destino", aclara Manuel Suaces, professor na UNED de filosofia e autor do livro Arthur Schopenhauer: religión y metafísica de la voluntad, que aproveita para reditar. "Ele nom quer reprimir o que nos dá prazer, ele propom entendê-lo para compensá-lo como planejavam os epicúreos. O desejo é o motor da vida, como imos apagá-lo! Haverá que aprender a utilizá-lo!", engade.

É a crítica ao desejo insatisfeito o que mais achega a Schopenhauer ao consumismo desamalhoado do momento. Raul Gabás, catedrático de filosofia da Universidade Autónoma de Barcelona e experto em filosofia alemá do século XX, procura os laços com o génio alemám: "di que o que deseja sofre, imagina-te. Desejamos o que nom temos e pensa que por força de agitar o desejo o home nom pode ser feliz. Isso na nossa sociedade de consumo... Quere apagar-nos o desejo para librar-nos do mal", engade ["a causa da dor é o desejo", esta é umha das máximas do budismo, muito anterior a Shopenhauer; N.B.].

A maneira é algo que nom escapa a ninguém: subir ao monte a contemplar a natureza, recolher cogumelos, extasiar-se com um sol-pôr ou sentir o rio passar. Quer dizer, abandonar-se à contemplaçom para liscar do desejo. "Na contemplaçom há tranqüilidade. Na oferta de bens da nossa sociedade está ou açoute. Numha situaçom de mileurismo de quê nos serve toda essa oferta de produtos? Estamos condenados a perseguir metas que se nos escapam cosntantemente", fala Gabás da existência hipotecada.

A grande crítica que planejou ao progresso é equiparável a que se pode fazer hoje do capitalismo: "Na Ilustraçom ninguém pensou mal do home. O marxismo também confiou ingenuamente em que o home ia ser bom". Schopenhauer, a pesar de ser contrário ao marxismo, concidia com ele na solidariedade, em que a riqueza dum estava nos outros, porque eles ajudava a superar a soidade, a tristeza e o egoismo.

Contra a sede de poder

"Com o seu estilo pessimista negou-se a fazer um panegírico a favor do bem que estavam os homes: foi um fundo conhecedor da miséria humana", explica para sublinhar que o que apodrecia o home de entom é o mesmo que nos fai nacos hoje: a sede de poder e dominaçom. O querer ser mais é umha fonte fundamental de sofrimento. A mais desejo, mais dor.

Neste aspecto, a dramaturga Angélica Liddell bebe directamente de Schopenhauer. Passou o seu melhor verao no Festival de Avignon representando dous espectáculos, A casa da Força e O ano de Ricardo. Ao entrar no seu espaço em rede recebe-nos a seguinte cita: "A vida é umha cousa desprezável. Decidim passar-me a existência pensando nisso", Shopenhauer, por suposto. "Em qualquer sociedade onde se esgrime a frivolidade, a superficialidade e a asneira como arma contra o pensamento, a beleza e a consciência da dor, necessita-se o pessimismo, os pessimistas som os que se questionam a realidade, os que detectam o mal-estar, os que procuram soluçons", resume a autora.

Deste jeito, o pessimismo permite compreender o conflito de estar vivo e tratar de perceber o mundo. "Fazer do pessimismo virtude parece-me umha das políticas mais sensatas possíveis, e desde logo pode-se viver felizmente ao tempo que se preconiza "a impiedade do optimismo" (a expressom é sua) que nos rodeia", declara o escritor Ricardo Menéndez Salmón, para quem muita gente nom sabe que é schopenhaueriana. "A filosofica do velho carrancudo calou fundo no mundo contemporáneo, sobretodo logo da dor universal precurada pola Grande Guerra. Eu diria que os dous filósofos de mais éxitos durante o passado século fôrom ele e o seu discípulo mais perspícuo: Nietzsche" [piares da ideologia ou pseudoestética do pós-modernismo; N.B.].

A Schopenhauer há que lê-lo com a mesma disáncia com a que ele escreveu sobre a realidade e a dor. Tam irónico como para rir-se do mundo que se estetiza, tam sarcástico como para desmontar o riso dumha sociedade inexpressiva.

Pensamento dum pesimista que alberga esperanças na existência

Arte

Para conter o desejo insatisfeito, o ser humano apenas tem como ferramente a contemplaçom. "O nécio persegue os prazeres da vida a vontade e vê-se enganado: o sábio evita o mal", escreve. Por isso, a arte é o caminho para a sabiduria, a calma. A arte alívia a dolorosa existência de viver pendentes das nossas arelas.

Desejo

A categoria que nos arrastra à dor é o desejo. Desejamos o que nom temos, sofremos porque nunca o conseguiremos. A eterna insatisfacçom. Toma a ideia de Platom e engade que a agitaçom do desejo nunca fará feliz o home. Apenas o génio é quem de substraer-se do desejo e xebrar a natureza para recreá-la e superar os nossos anseios.

Moral

A moral como compaixom. Pensa Schopenhauer que o maior sofremento do home é luitar entre todos [cp. "mutualismo" em Kropotquine; N.B.]. A solidariedade e a compaixom liberará o ser humano da caída, que é a existência. A nossa individualidade é o nosso cativério ["o home nasce livre, mas em todas partes está encadeado", Rousseau. Esta consideraçom bate de frente com o emprego que do irracionalismo fará posteriormente o fascismo e ainda o pós-modernismo utraliberal, já que o individuo anula-se e torna-se massa, nom supera a luita entre homes, a luita de classes até, mediante o mútuo apoio e a solidariedade; a contrário converte-se em rabanho; N.B.]. A vida mesma é dor porque somos desejo e nunca o satisfazemos.

Sufrimento

O mundo é desordem, e maldade por enteiro: "Toda vida é sufrimento", segundo o próprio Schopenhauer. Qualquer crença na possibilidade de melhorar o mundo dos homes apoia-se por completo numha ilusom. O qual nom quere dizer que nom seja necessário deixar de perseguíla. "Os inesgotáveis esforços por afastar a dor nom servem mais que para mudar o seu aspecto".

Vontade

A vontade é a cousa em si, a essência do mundo. Vontade significa cega pulsom vital, empurre irracional, mas também fonte primordial de toda realidade, matéria, dor, culpa. A vontade é vontade de vida. A vontade é a essência do mundo.

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